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Imagine a mobilidade urbana transformada em um mercado de prestação de serviço multimodal. Ou, em outros termos, pense que é possível utilizar qualquer meio de transporte sem a necessidade de um bilhete físico ou dinheiro em espécie.
Difícil? Pois é, pois saiba que a tecnologia já permite tornar realidade o que, até outro dia, era apenas vontade de técnicos e especialistas.
Trata-se do PROCLOUD, desenvolvido pela PRODATA MOBILITY BRASIL e cuja inovação está em transformar o celular numa espécie de “carteira virtual”. Isso significa que o cidadão pode comprar créditos para gastar em passagens de transporte – ônibus, metrô, bicicletas compartilhadas, trens, etc –, além de usar o próprio aparelho como ferramenta de validação, graças a um QR Code estampado na tela.
Como explicou João Ronco Jr. , presidente da PRODATA MOBILITY BRASIL em palestra realizada na 6ª Semana de Tecnologia ITS da UITP Latin America, trata-se da realização concreta do que é chamado de MaaS – Mobility as a Service (Mobilidade como um serviço), a base de um novo sistema de bilhetagem eletrônica.
O PROCLOUD já está em operação em Campinas, que opera com frota de 1.100 carros, desde dezembro de 2018. A cidade, a partir de 19 de janeiro deste ano, não usa mais dinheiro como forma de pagamento nos ônibus.
Campinas já havia inovado ao implementar o QR Code impresso em papel como forma de pagamento, voltado para os turistas ou usuários eventuais do transporte coletivo na cidade, pessoas que não possuem o Bilhete Único.
Agora, com a chegada do PROCLOUD, os campineiros ganham mais uma forma de acesso ao transporte coletivo.
Em sua palestra no evento da UITP, João Ronco Jr. explicou do que se trata o MaaS. “É uma solução completa e integrada de mobilidade, interconectada entre os diversos modais e consumida como um serviço pelo usuário final. Ela possibilita a combinação de transporte público e prestadores privados de serviços de transporte através de um servidor unificado, que cria e gerencia as viagens, as quais podem ser pagas por meio de uma conta única. Ou seja, oferece aos viajantes soluções de mobilidade integradas, com base nas necessidades individuais de cada usuário.
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A mudança de conceito começa pela resposta a uma simples pergunta: onde está o dinheiro?
“Pelo sistema que conhecemos hoje, o acesso ao transporte coletivo se dá ou pelo pagamento direto na catraca, usando dinheiro, ou através de um meio físico, como o bilhete único. No caso do dinheiro, este vai direto para o operador. No caso da bilhetagem, os créditos do transporte são carregados no cartão. No caso do PROCLOUD, os créditos de transporte ficam armazenados na nuvem, e são contabilizados pelo sistema quando a viagem é realizada”, explica Leonardo Ceragioli, diretor comercial da PRODATA MOBILITY BRASIL.
Ronco explica que o sistema de bilhetagem com base em conta na nuvem (ABT – Account Based Ticketing) resolve uma série de problemas enfrentados pelos sistemas de transporte coletivo. “Sistemas de bilhetagem com base em dinheiro ou papel geram altos custos operacionais, pois é preciso toda uma operação para aceitar, gerenciar, distribuir, vender créditos e administrar esses valores”, diz ele.
Quando se fala em sistemas de cobrança onde o dinheiro já não é utilizado, como no caso do bilhete único, Ronco explica que os dados relacionados à bilhetagem tendem a ser armazenado em vários lugares: “os créditos estão no cartão de transporte do usuário, enquanto as informações referentes às tarifas estão em outro local”.
Logo, centralizar todas essas informações faculta ao passageiro não só ter acesso às informações tarifárias, como ainda traz transparência em relação às tarifas que ele está pagando para se locomover usando os modos de transporte coletivo.
“Mas o mais importante, e aí está a ‘novidade desta inovação’, é que isso facilita a criação de uma solução de cobrança de tarifas que independe da emissão de cartões dedicados ou outros dispositivos para acessar o transporte”, completa Leonardo Ceragioli.
“Essa inovação cria uma ponte para um completo Ecossistema de Cidade Inteligente”, diz Ronco.
O "case" de campinas
Conversamos com o secretário de Transportes de Campinas e presidente da Emdec – Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas, Carlos José Barreiro, para colher mais dados da experiência que já se tornou realidade na cidade.
Barreiro faz questão de datar o início dessas mudanças em 2014, “com a determinação de que um dia nós íamos retirar o dinheiro como forma de pagamento dentro dos ônibus”. Barreiro explica que o primeiro esforço foi retirar os cobradores, “criamos um programa de readaptação desses profissionais, alguns aderiram, outros não”. Depois, ele diz, Campinas criou um processo de bilhete em substituição ao dinheiro que, segundo ele, “teve um sucesso parcial”.
“Continuamos investigando alternativas, até que no final de 2017 chegamos ao QR Code em papel. Com a contribuição da Prodata, que é quem detém o software da bilhetagem, conseguimos que eles desenvolvessem a tecnologia que permitisse que os validadores fizessem a leitura desse sistema”, conclui o secretário de Transportes de Campinas.
A primeira experiência com o QR Code impresso em papel, conta Barreiro, foi realizada no início de 2018. Após alguns problemas, que foram sendo resolvidos à medida em que surgiam, avaliou-se que o sistema estava maduro para ser escalado em uma área maior da cidade.
No meio do ano passado o pagamento via QR Code em papel foi implantado no Terminal Central, o maior de Campinas, por onde passam 40% dos usuários do sistema de transporte. Após outro pequeno período de adaptações e correções, cerca de dois meses, o QR Code impresso foi implantado no segundo maior terminal da cidade, o Terminal do Mercado, por onde passam outros 20% dos usuários.
Com o sucesso das experiências, a Secretaria decidiu marcar o dia 19 de janeiro de 2019 como a data para a implantação definitiva e em todos os ônibus da cidade, eliminando de vez o uso do dinheiro como forma de pagamento da tarifa no interior dos coletivos. Os usuários que não detinham o Bilhete Único, passaram a ter a opção de adquirir a passagem no formato QR Code em mais de 300 postos de vendas espalhados na cidade. O Diário do Transporte noticiou à época: Campinas elimina pagamento em dinheiro nos ônibus a partir do dia 19 e promete lançar licitação até março
Paralelamente a isso, Barreiro conta que já se estudava o desenvolvimento do QR Code no celular, o que originou o Procloud. Primeiramente no sistema Android, e na sequência no IOS, o Procloud, por meio do aplicativo da Transurc (Associação das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Campinas), finalmente foi implantado em todo o sistema em dezembro de 2018.
“Com isso, qualquer cidadão que tenha um celular com o sistema operacional IOS ou Android, ele baixa o aplicativo gratuitamente, faz o cadastro simplificado, designa um cartão de crédito onde os débitos serão efetuados, e a partir daí ela pode comprar quantos bilhetes quiser. A imagem do QR Code fica no seu celular, e isso é lido nos validadores dentro dos ônibus”.
Em resumo, os validadores dos ônibus de Campinas fazem o mesmo papel que os leitores de códigos de barra que já estão disseminados em vários serviços atualmente, como no check-in dos aeroportos, nas leitoras dos ingressos de cinema, jogos de futebol, teatro, etc.
Sistema zerou assaltos nos ônibus
Até 19 de janeiro, com a extinção do uso do dinheiro no interior dos ônibus, Barreiro conta que 9,5% dos usuários optavam por esta forma de pagamento das tarifas. Atualmente, ele estima que apenas 1,5% dos pagantes optaram pelo sistema QR Code, seja impresso em papel, seja pelo aplicativo. Ou seja, o restante dos usuários migrou para o Bilhete Único.
Assim, Barreiro calcula que este pequeno número de pagantes é constituído por usuários eventuais do sistema. “São pessoas que vêm a Campinas para uma consulta médica, ou para fazer compras, e que, portanto, não veem motivo para adquirir um Bilhete Único”, ele explica.
O secretário explica que o Bilhete Único tem uma larga vantagem – ele garante a validade dos créditos por um ano, tem um valor mais baixo – R$ 4,30 contra R$ 4,70 do QR Code –, e ainda permite a integração, utilizando mais de um ônibus num prazo de duas horas. “Mesmo assim, algumas pessoas preferem continuar com a mesma sistemática do uso do dinheiro, só que agora adquirindo o QR Code”.
Barreiro destaca outro ótimo resultado da retirada do dinheiro do interior dos ônibus. “Nós tínhamos entre 30 e 45 assaltos dentro dos coletivos, em que o assaltante roubava o dinheiro da passagem. Em fevereiro, primeiro mês cheio desse novo modelo funcionando, não tivemos um caso sequer de roubo.”
Expansão do PROCLOUD dependerá da nova licitação
No entanto, quando eu perguntei ao secretário Carlos Barreiro se há ideia em estender o sistema de QR Code no celular para o usuário do Bilhete Único, dando a opção de eliminar o meio físico de pagamento, a resposta foi negativa. E ele explica o motivo: “o sistema atual de concessão, que rege o sistema de transporte coletivo de Campinas, não permite isso”.
Mas a próxima licitação, que deve sair nos próximos 2 ou 3 meses segundo o secretário, já irá prever essa possibilidade.
“Esse sistema permite uma comunicação direta com o cliente do sistema de transporte”, Barreiro diz. “Estamos pensando inclusive, na futura licitação, em oferecer descontos em caso de recargas, por exemplo, de dez passagens, como forma de estimular o uso dos ônibus”.
Com isso, além de todos os benefícios já citados, advém a grande economia que este sistema trará para a mobilidade quando ele estiver implantado em uma cidade ou até mesmo numa região metropolitana.
O “pulo do gato”, no entanto, é o avanço que essa tecnologia permite alcançar nos diversos modos de mobilidade da cidade.
Segundo Barreiro, ela pode ser implementada para o usuário pagar, com sua “carteira virtual”, outros tipos de serviços de transporte, como aluguel de bicicletas, táxi, patinetes elétricos, trem e metrô, etc. Ou seja, possibilitar ao campineiro que, com o uso de uma única “moeda”, ela possa fazer sua viagem compondo diferentes modos.
Na última Reunião do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Públicos de Mobilidade Urbana, que aconteceu em Brasília nos dias 21 e 22 de março, Barreiro foi contar a experiência que Campinas vem desenvolvendo, e acabou chamando a atenção de secretários de várias partes do país, que agora querem aplicar sistemas semelhantes em suas cidades.
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