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Dois anos após a publicação do decreto que regulamentou o Inovar-Auto, a política industrial direcionada a forçar o desenvolvimento local do setor automotivo brasileiro, finalmente parece estar quase tudo pronto para o início das operações do sistema de rastreabilidade de autopeças, que começa a funcionar em a partir de 1º de outubro ainda em fase de testes. A medida é considerada pelos fabricantes de peças fundamental para aumentar de forma real o uso de componentes nacionais nos veículos produzidos no Brasil, pois irá deduzir da base de cálculo de incentivos do Inovar-Auto a porção importada das peças usadas na produção, o que em tese deve aumentar a busca por fornecedores locais, para elevar ao máximo o desconto permitido de até 30 pontos porcentuais do imposto sobre produtos industrializados (IPI) aplicado sobre todos os veículos vendidos hoje no País.
“Bom ou ruim, não importa nesse momento. O importante é que algo finalmente vai começar”, destacou David Wong, diretor da consultoria AT Kearney, ao iniciar sua apresentação sobre “Os Avanços do Programa de Rastreabilidade”, durante o II Workshop Os Novos Desafios da Legislação Automotiva, realizado por Automotive Business na segunda-feira, 8, em São Paulo. Wong, que vem acompanhando de perto a evolução do sistema que será aplicado, adiantou como será feito na prática o rastreamento até o segundo nível de fornecimento (tier 2) da cadeia de suprimentos. Ele lembrou que ainda podem surgir modificações pontuais, pois a regulamentação definitiva deve ser publicada por volta do dia 20 deste mês por meio de portaria do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), com base no Decreto 8.294, efetivado pelo governo em 13 de agosto para abrir caminho para a rastreabilidade.
Segundo o decreto, serão impostas multas de 2% do valor da venda para as empresas que deixarem de informar as características das peças vendidas (basicamente, o valor total e o da porção importada dos componentes), e de 1% para quem prestar informações incorretas. “Portanto, os fornecedores podem ser prejudicados e também podem prejudicar as montadoras se deixarem de declarar corretamente o que estão vendendo”, alerta Wong. “Como é um trabalho bastante complexo, que envolve milhares de operações por dia, foi dado um prazo de seis meses sem a aplicação das multas, para que as empresas comecem a alimentar o sistema do MDIC e tenham tempo para fazer as adaptações e correções necessárias”, completa.
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Funcionamento
A partir de 1º de outubro, Wong conta que o sistema começa a funcionar apenas com as informações das montadoras: “Elas deverão informar todos os gastos diretamente ligados à fabricação dos veículos, incluindo compras de insumos e componentes (que correspondem de 55% a 60% do custo de produção) e custos de montagem (normalmente 15% a 20%), incluindo energia e mão-de-obra só do chão de fábrica, ficam de fora as despesas administrativas e de vendas (20% a 30% do preço de um carro)”, explica.
Depois, a partir do segundo mês de operação do sistema, entre os dias 1º e 15 de cada mês as fabricantes de autopeças enviam às montadoras as informações, relativas ao mês anterior, sobre o preço total de venda e a parcela impostada desse valor. Os fornecedores de segundo nível (tier 2), que vendem aos tier 1, também vão repassar essas declarações de conteúdo importado, mas com algumas margens de tolerância: insumos que contêm acima de 70% de importação serão considerados 100% importados (e portanto não poderão ser usados para obter crédito de IPI), de 40% a 70% considera-se 50% de dedução do valor, e abaixo de 40% de porção importada a peça é 100% nacional.
Os fornecedores de primeiro nível vão incluir essas declarações dos tier 2 em seus relatórios às montadoras e acrescentar suas importações diretas (valor CIF, com seguro e frete, mais o imposto de importação pago) ao valor do que foi fornecido. De posse dessas informações, os fabricantes de veículos terão apenas cinco dias (de 16 a 20 de cada mês) para conferir os dados recebidos e solicitar possíveis retificações. “É um prazo bastante apertado para checar milhões de informações”, relata Wong.
As retificações podem ser feitas a partir do 21º dia de cada mês e as montadoras só poderão usufruir do desconto de IPI (sobre até 30 pontos porcentuais do imposto) a partir do terceiro mês de operação do sistema de rastreabilidade, em uma espécie de conta corrente de benefício fiscal. “Portanto, os fabricantes só poderão usar os créditos de suas compras para abater o IPI se tiverem todas as informações de seus fornecedores”, avisa Wong.
A partir de abril de 2015 começam a valer as multas para quem não informar ou prestar declarações incorretas. “O rastreamento reduz a parcela de compras dedutível do IPI, pois exclui a parte importada, o que pode forçar as montadoras a comprar mais aqui”, diz Wong.
Até o momento, todas as compras feitas no País, mesmo que fosse um sistema apenas montado com 100% de peças importadas, podiam ser abatidas integralmente dos 30 pontos de IPI aplicados sobre os veículos, bastando para isso que houvesse uma nota fiscal emitida pelo fornecedor à montadora. Assim, durante quase dois anos de letargia do governo, os fabricantes de veículos acumularam créditos de IPI dentro da legislação do Inovar-Auto sem que necessariamente tivessem aumentado suas compras de itens feitos no Brasil. Tudo que foi acumulado poderá ser usado até o fim do programa, em 2017. Portanto, ainda há gordura para queimar antes que o Inovar-Auto possa de fato incentivar a indústria nacional de autopeças.
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