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Samanta Luchini    |   03/03/2019   |   Desenvolvimento Humano   |  

As competências são como músculos

Nossos músculos mantem nosso corpo de pé para que possamos viver. E nossas competências nos mantem de pé para enfrenarmos os diversos desafios do dia-a-dia. Se é possível treinar os músculos para que eles fiquem mais fortes, a mesma regra se aplica às nossas competências.

Em algum momento da nossa vida escolar, aprendemos a função e a importância que os músculos exercem no corpo humano.

Nosso sistema muscular possui cerca de 650 músculos, que juntos são responsáveis por produzir nossos movimentos globais, como respirar, andar, correr, sentar e levantar. Os músculos estabilizam nossas articulações, participam essencialmente da manutenção das nossas posições corporais, como ficar em pé, agachado ou sentado e também atuam no controle da temperatura corporal. As contrações musculares ajudam a regular o tamanho dos órgãos e a movimentar as diversas substâncias que transitam em nosso corpo, para que ele funcione corretamente.

Isso significa, de maneira bem resumida, que os músculos literalmente nos mantem “em pé” para que possamos dar conta de toda a demanda da vida.

Indo um pouco além, você também já ouviu falar que quanto mais fortalecidos e tonificados estão nossos músculos, melhor eles desempenham essas funções. E que o fortalecimento dos nossos músculos, especificamente aqueles que garantem os nossos movimentos, se dá por um processo de treinamento constante, gradativo e disciplinado.

Vamos utilizar um exemplo bem prático para ilustrar isso.

Imagine que hoje é o seu primeiro dia na academia de musculação. Durante a primeira conversa com o instrutor, você manifesta o desejo de fortalecer o seu bíceps (músculo do braço, localizado entre o ombro e o cotovelo), pois costuma carregar peso e precisa ter força. Além disso, ressalta ainda que gostaria de ter esse músculo mais firme e com os contornos mais bem definidos.

Então o instrutor passa a orientação de que você deve utilizar um haltere de 3kg, com o movimento de rosca direta (flexão e extensão do cotovelo, movimentando-se o antebraço de baixo para cima), executado em três séries de dez repetições. Esse treino deve ser realizado três vezes por semana, durante o período de trinta dias.

Se você executar o treino que foi recomendado pelo instrutor, o que vai acontecer ao final do período de trinta dias? Provavelmente, você perceberá algumas mudanças no seu bíceps. Tônus, formato, resistência e aumento da força por exemplo.

Agora, se você deixar o treino anotado no papel ou gravado no bloco de notas do seu celular, sem executá-lo, o que vai acontecer? Nada. Nada mesmo. Seu bíceps continuará igual.

Com as nossas competências comportamentais acontece exatamente da mesma forma: as que são treinadas se fortalecem; as que não são treinadas ficam do mesmo jeito, com chances de atrofiarem e não funcionarem mais.

Assim como a estrutura muscular mantem nosso corpo de pé, nossas competências também nos mantem de pé para os inúmeros desafios do dia-a-dia, para a obtenção dos nossos resultados, para o atingimento dos nossos objetivos, para a qualidade dos nossos relacionamentos, para a vivência daquilo que realmente importa para nós.

É claro que o treino para as competências não funciona com halteres e repetições de três séries de 10 movimentos, como acontece com os músculos. Mas é igualmente possível, se houver empenho, disciplina e a parte mais importante: a especificação dos comportamentos observáveis que nos levam na direção da competência. (já discutimos mais detalhadamente esse aspecto no artigo Estabelecendo Metas Comportamentais)

Vamos analisar algumas possibilidades a partir desta metáfora.

Suponha que você queira aprimorar a escuta ativa, competência essencial para a comunicação de qualidade. Um bom treino para fortalecer esse músculo pode ser configurado com a repetição destes quatro comportamentos observáveis: 1) manter o contato visual e a atenção concentrada na pessoa que fala; 2) confirmar a compreensão daquilo que acabou de ser dito; 3) repetir, com suas próprias palavras, aquilo que acabou de ouvir; 4) fazer perguntas a fim de obter mais informações e aprofundar o entendimento. Esses quatro comportamentos funcionam como o caminho para a melhoria da competência.

No começo pode parecer mecânico ou artificial, mas a premissa implícita aqui é a de que com a repetição, esses comportamentos se tornem naturais e aprimorem gradativamente a sua habilidade como ouvinte. Lembre-se de quando você aprendeu a dirigir ou andar de bicicleta: no início, você tinha um check-list imenso de tudo o que precisava fazer, tudo mecânico, às vezes até forçado. Agora pense em como você dirige ou anda de bicicleta hoje: é tão natural que nem percebemos conscientemente cada comportamento que é colocado em ação. O processo simplesmente flui.

Imagine que o seu objetivo é aprimorar a empatia, competência essencial para a qualidade dos relacionamentos. Esse músculo pode ficar mais forte se você colocar em prática esses comportamentos: 1) visualizar a si mesmo numa situação idêntica à da outra pessoa e pensar em quais seriam as suas próprias atitudes; 2) ver e pensar a situação como se você fosse mesmo a outra pessoa, isto é, com os olhos e a cabeça dela e não os seus próprios; 3) lembrar-se de que a outra pessoa tem o direto de pensar como pensa e de sentir o que sente; 4) abster-se de fazer qualquer tipo de julgamento.

Pense agora no músculo da resiliência. Quanto mais forte ele estiver, mais apropriadamente você vai lidar com as inúmeras adversidades do cotidiano. Além disso, vai viver mais e melhor, pois a resiliência é uma competência que se associa diretamente à saúde do nosso corpo e da nossa mente. Desta forma, todas as vezes em que estiver diante de uma adversidade, você pode treinar os seguintes comportamentos: 1) identificar uma parte do problema, mesmo que pequena, que você possa alterar, minimizar ou resolver de imediato; 2) reconhecer a sua própria responsabilidade na situação (pois ela sempre existe) de forma que possa evitar as mesmas atitudes no futuro; 3) limitar o alcance do problema, evitando que ele afete as outras áreas da sua vida; 4) manter em mente a ideia de que os problemas não duram para sempre, mesmo os mais complexos mais cedo ou mais tarde passam.

Para finalizar, vamos considerar um treino capaz de fortalecer o músculo da gestão de conflitos. Você já deve ter reparado na quantidade de tempo e energia que gastamos com a administração de conflitos e divergências, tanto no trabalho quanto na vida pessoal. O caminho para aprimorar essa competência pode ser mais curto e produtivo se você: 1) descrever os fatos de forma simples e objetiva, sem interpretar ou rotular; 2) expressar como você se sente dentro da situação, falando sobre suas próprias emoções; 3) estabelecer um acordo entre as partes envolvidas, esclarecendo o que deve ser feito, por quem, como, quando e porquê; 4) visualizar e verbalizar o resultado que será alcançado se as partes envolvidas cumprirem o acordo; 5) cuidar da forma com a qual vai se comunicar – tom da voz e expressão corporal -  lembrando que na maioria absoluta das vezes o que gera um conflito não é o que está sendo dito, mas como está sendo dito.

Por mais abstratas que as competências comportamentais possam parecer, elas sempre podem ser desconstruídas em comportamentos observáveis. E aqui vem a melhor notícia: tudo o que pode ser observado, pode ser aprendido.

Peter Drucker foi muito pontual ao afirmar que “o maior benefício do treinamento não vem de aprender algo novo, mas de se fazer melhor aquilo que já fazemos bem”. Seja na dimensão, física ou na dimensão comportamental, o aperfeiçoamento é a famosa condição sine qua non, ou seja, essencial e indispensável.

Até os melhores treinam. E treinam pra valer. Bora treinar?

Um grande abraço e até breve...

O conteúdo e a opinião expressa neste artigo não representam a opinião do Grupo CIMM e são de responsabilidade do autor.
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Samanta Luchini

Mestre em Administração com Foco em Gestão e Inovação Organizacional, Especialista em Gestão de Pessoas pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul – USCS e em Neurociência pela Unifesp.
Psicóloga pela Universidade Metodista de São Paulo.
Executive & Life Coach em nível Sênior, com formação internacional pelo ICI (Integrated Coaching Institute) em curso credenciado pela ICF (International Coach Federation).
Professora convidada dos programas de pós-graduação da FGV/Strong, Universidade Metodista e Senac, dos programas de MBA da Universidade São Marcos e Unimonte, e dos cursos FGV/Cademp, para a área de Gestão de Pessoas.
Professora conteudista do Centro Universitário da Fundação de Ensino Octávio Bastos – UNIFEOB.
Formadora de consultores e treinadores comportamentais.
Atua há mais de 23 anos com Gestão de Pessoas em diversas empresas e segmentos, dentre elas Wickbold, Bridgestone, Bombril, Solar Coca-Cola, Porto Seguro, Grupo M. Dias Branco, Prensas Schuler, Arteb, Grupo Mardel, Tegma, Pertech, Sherwin-Williams, Grupo Sigla, Unilever, Engecorps, Nitro Química, Grupo Byogene, Netfarma, NTN do Brasil, TW Espumas, Ambev, Takeda, Pöyry Tecnologia,
Neogrid, Scania, Kemp, Ceva Saúde Animal, Embalagens Flexíveis Diadema, Sem Parar, CMOC, Camil e Toyota.
Em sua trajetória profissional e acadêmica, já desenvolveu mais de 27.000 pessoas, com uma média de avaliação superior a nota 9,0 em todos seus treinamentos.
Palestrante, consultora de empresas e autora de diversos artigos acadêmicos publicados em congressos e revistas.
Colunista da revista Manufatura em Foco – www.manufaturaemfoco.com.br


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