Motor browniano funciona cem anos depois de criado

Partículas suspensas em um fluido apresentam movimentação aleatória que, em teoria, poderiam fazer funcionar um motor

Partículas suspensas em um fluido apresentam uma contínua movimentação aleatória - é o chamado movimento browniano, causado pelos choques entre as moléculas que compõem o fluido.

Em 1912, o físico polonês Marian Smoluchowski teve uma ideia inusitada: construir um motor em nanoescala para converter o movimento browniano em trabalho.

Na época, o experimento era absolutamente irrealizável, por falta de tecnologia. Isso colocou a ideia de Smoluchowski na categoria daquilo que os físicos chamam de "experimento conceitual", ou "experimento de pensamento."

Mas um grupo de físicos holandeses e gregos decidiu testar pela primeira vez a ideia, mas com um dispositivo em escala macro. Usando um "gás granular" para simular o movimento browniano, eles comprovaram que ideia não apenas funciona, mas funciona muito bem.

Motores moleculares
Motores moleculares são comuns na natureza. São motores assim que tensionam e relaxam nossos músculos. Mas eles se movimentam de forma totalmente diferente dos motores que estamos acostumados em escala macro.
Em vez de girarem, eles se movem para frente e para trás. E esse movimento acontece em meio a um bombardeamento contínuo de moléculas que se movimentam aleatoriamente ao seu redor, devido ao movimento browniano.

Se esses motores moleculares se movimentam acionados pelo movimento browniano, ou se são fortes o suficiente para vencer a força nada desprezível da agitação das moléculas, ainda é uma questão controversa.

Motor de Smoluchowski
A ideia de Smoluchowski era construir uma série de palhetas, montadas sobre um eixo, que seriam postas em movimento pela agitação das moléculas ao seu redor.

Como o movimento ocorreria igualmente em ambas as direções de rotação, Smoluchowski concebeu um segundo elemento, um dente de engrenagem assimétrico. Isto garantiria que o eixo só rodaria em uma única direção e, portanto, poderia executar o trabalho, por exemplo, puxando um pequeno peso para cima.

No entanto, em 1963, Richard Feynman demonstrou que a segunda lei da termodinâmica impediria que o dispositivo funcionasse em um sistema que estivesse em um estado de equilíbrio térmico - o que parecia ter condenado a ideia de Smoluchowski ao esquecimento.

Gás granular
Ocorre que a objeção de Feynman não se aplica a um sistema longe do equilíbrio térmico - um gás granular, por exemplo.

Se um recipiente cheio de esferas for sacudido vigorosamente, as esferas vão começar a se mover tão rapidamente que formarão um estado gasoso artificial, imitando o que acontece quando as moléculas de um gás se agitam.

A grande diferença deste análogo com um gás molecular real é que, assim que a agitação for interrompida, as esferas vão perder energia em um espaço muito curto de tempo, voltando a ficar imóveis no fundo do recipiente.

Isso acontece porque uma parte da energia das sacudidelas é perdida em cada colisão entre as esferas, tornando necessária a manutenção de uma fonte externa constante de energia para manter o estado gasoso granular - logo, um sistema longe do equilíbrio térmico, viabilizando a realização do motor browniano de Smoluchowski.

Retroalimentação por convexão
Usando seu gás granular, Peter Eshuis e seus colegas demonstraram com sucesso que o experimento de pensamento de Smoluchowski não apenas funciona nesse ambiente, como funciona soberbamente.

Os cientistas verificaram que ocorre uma troca inesperada entre as palhetas do motor e o gás granular: assim que as hélices começam a girar, acionadas pelas partículas granulares, elas retroalimentam o movimento de rotação no gás - um fenômeno conhecido como rolo de convecção.

Isso reforça o movimento do motor, permitindo uma rotação quase contínua.


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