Como o terremoto financeiro chinês pode afetar o Brasil?

A bolsa de Xangai caiu 30% nas últimas três semanas, acumulando perdas de mais de US$ 3 trilhões - cerca de 10 vezes o PIB da Grécia.

O terremoto financeiro que está ocorrendo na China poderá ter efeitos significativos no Brasil, segundo economistas consultados pela BBC Brasil.

Nesta quarta-feira (8), o pregão chinês fechou em queda de 5,9%, após abrir com perdas de 8%. Foi um dia de "pânico" nos mercados chineses. No total, as negociações dos papéis de 1,3 mil empresas já foram suspensas.

Segundo especialistas, o mercado brasileiro pode ser afetado por essas turbulências principalmente de duas maneiras.
De um lado, a queda da bolsa chinesa contribuiria para aumentar a percepção de risco no mercado internacional, já abalada pela crise na Grécia.

"Como resultado, os investidores tendem a fugir dos mercados emergentes ou a cobrar um preço maior para colocar dinheiro nesses países", diz Marcel Caparoz, economista da RC Consultores. A queda do real frente ao dólar nesta quarta-feira já seria um reflexo desse movimento de fuga dos ativos e moedas emergentes.

Em meio ao temor de um colapso no mercado chinês, a moeda americana chegou a R$ 3,23, maior valor em três meses. O Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo, também fechou em baixa de 1,07%.

"Além disso, dependendo do modo como a crise afetar a economia chinesa, podemos ter um impacto importante sobre o preço das commodities e as exportações brasileiras no médio prazo", diz Caparoz.

Ele ressalta que, hoje, o minério de ferro, a soja e seus derivados representam um quarto das vendas externas do Brasil - e a China é, de longe, o principal mercado para esses produtos.

"Por isso, essas turbulências podem atrapalhar a recuperação da balança comercial brasileira em um momento em que o país procura retomar o crescimento", concorda André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos.

"Na realidade, empresas que produzem minério de ferro (como a Vale) já estão sofrendo com uma queda do preço do produto em função do desaquecimento chinês e essa queda no mercado chinês certamente não vai ajudar."


Continua depois da publicidade


Novo 'crash'?

Para Perfeito, porém, algumas análises sobre as possíveis repercussões da queda da bolsa chinesa são exageradas.
O economista da Gradual diz que o mercado já estava monitorando os papéis chineses e esperando uma dinâmica de 'estouro da bolha'.

"É claro que essa queda preocupa e deve ser monitorada, mas também não deve ser nenhuma tragédia, nenhum 'crash de 1929' chinês", afirma.

Desde o início do ano, as ações das empresas listadas na bolsa de Xangai tiveram alta de mais de 140%, apesar da economia do país estar desaquecendo.

Muitos chineses chegaram a tomar empréstimos para comprar ações nesse período de bonança.

"Houve um descolamento entre o que ocorria na bolsa e os fundamentos da economia real, então era natural que alguma hora os papéis começassem a cair", diz Caparoz.

Isso ocorreu em meados de junho, quando os investidores começaram a achar que já estava na hora de vender seus papéis e realizar seus lucros.

Para conter a queda das ações, o governo anunciou um pacote de medidas.

A agência que supervisiona as maiores estatais do país, por exemplo, disse tê-las aconselhado a não vender ações "para garantir a estabilidade do mercado".

"Mas essas medidas parecem ter aumentado o medo de um colapso na bolsa e os papéis caíram mais ainda", diz o analista da RC Consultores.

Robert Peston, editor de economia da BBC, explica que o "terremoto financeiro chinês" até agora vinha causando menos alarme no cenário internacional que a crise grega porque esse prejuízo de "US$ 3 trilhões está sendo dividido entre cerca de 90 milhões de chineses em vez de apenas alguns governos europeus."

"Mas não se pode diminuir a importância política de 90 milhões de chineses se sentindo bem menos ricos", diz ele. "Até por isso, o governo chinês está tentando de tudo para encontrar uma saída para a crise, embora esteja fracassando em suas tentativas."

Peston dá como exemplo a determinação de que 1,3 mil companhias tenham a comercialização de suas ações suspensa.

"A lógica é que isso impediria o preço das ações destas empresas de cair ainda mais, já que esses papéis não podem ser comprados ou vendidos. Mas, isso significa que outros US$ 26 trilhões em riqueza, ligados a essas ações, estão completamente congelados."

Para Peston, o colapso também prejudica os esforços do governo chinês de fortalecer o setor privado no país.
"O setor público é, mais uma vez, o 'todo poderoso' da China", diz ele. "E se a queda dos mercados levar a mais uma grande desaceleração no crescimento da segunda maior economia do mundo, todos vamos sentir as ondas de choque."