Azul ameaça cancelar compra da Embraer se MP da aviação não mudar

A Azul, terceira maior companhia aérea do país, vai cancelar parte de uma encomenda de 50 aviões na nova família de jatos da Embraer E-2, avaliada em R$ 3,1 bilhões, se a regulamentação do Programa de Desenvolvimento da Aviação Regional (Pdar) passar no Congresso e for sancionada pela presidente Dilma Rousseff da forma como foi redigida pelo relator da Medida Provisória 652/2014, Flexa Ribeiro (PSDB-PA).

“Da forma como está vamos cancelar a encomenda e vamos voar em aviões maiores”, disse o presidente da Azul, Antonoaldo Neves. Segundo ele, cerca de 20 aeronaves seriam necessárias para atender à demanda extra da aviação se o texto original fosse mantido. “Esse texto [alterado pelo relator] vai desestimular a aviação regional porque vai privilegiar aviões maiores. E não faz sentido querer fazer aviação regional com aeronaves grandes”, disse.

O programa de aviação do governo federal foi anunciado no ano passado. Conforme apresentado originalmente, o programa previa investimentos de R$ 7,2 bilhões em infraestrutura para recuperar, ampliar e modernizar mais de 200 aeroportos regionais do país, ao longo de cinco anos. 

O governo também quer usar recursos do Fundo Nacional de Aviação Civil (Fnac) — constituído por recursos levantados pelas outorgas pagas pelas concessionárias dos terminais aeroportuários e pelas taxas de interconexão nesses ativos — para subsidiar passagens aéreas e, assim, baratear o transporte comercial de passageiros.

É nesse tópico que aparece o maior problema, aponta o presidente da Azul, Antonoaldo Neves. No texto original, enviado pelo governo ao Congresso em 28 de julho deste ano, os subsídios cobririam os bilhetes de metade dos assentos disponíveis em um avião, mas no limite de até 60 passagens por voo, ou metade da aeronave, o que for menor. 

Acontece que o relator do projeto, senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), retirou do texto a ser votado essa limitação de 60 assentos. Segundo o parlamentar, dessa forma não haveria privilégios para uma determinada fabricante de avião ou uma determinada companhia aérea.


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Com essa mudança, afirma Antonoaldo Neves, os aviões da Embraer deixam de fazer sentido. O presidente da Azul, única companhia aérea do país que tem aviões Embraer na frota, diz que as aeronaves da fabricante brasileira, com cerca de 100 assentos, teriam então pelo menos metade dos assentos subsidiados para os voos considerados regionais — que partam ou pousem nesses terminais secundários.

Já os aviões da Boeing e Airbus — usados por TAM, Gol e Avianca — são aeronaves com pelo menos 140 lugares. Se o texto original do plano de aviação fosse mantido, os subsídios do plano de aviação regional não cobririam metade dos assentos dessas aeronaves.

“Eu vou tirar aviões de rotas menos densas e colocar aviões maiores para disputar mercado com as outras [companhias aéreas] nas rotas mais densas”, disse o presidente da Azul.

Nas contas deles, até 20 destinos hoje operados pela Azul terão as frequências reduzidas e menos passageiros serão atendidos. “Com um avião maior, vou fazer menos frequência e menos gente vai usar o avião. Ou seja, o plano de aviação regional vai desestimular a aviação regional”, disse Neves.

Com frota de 143 aeronaves e 850 voos diários, a Azul atende 103 destinos, respondendo por 30% de todas as decolagens no país. Nenhuma outra empresa atende tantos destinos como a empresa fundada por David Neeleman.

Nas contas inicialmente feitas pela Azul, 4,5 milhões de pessoas seriam incorporadas imediatamente ao universo de 100 milhões de brasileiros que já viajam anualmente de avião se o texto original do plano de aviação regional fo r mantido. 

Nesse caso, os subsídios serão dados conforme o tipo de avião usado, de R$ 0,03 a R$ 0,05 por assento, até o limite 60 assentos por voo. O volume de subsídios que cada companhia receberá vai depender das rotas que forem operadas e dos modelos de aviões usados.

Ainda conforme o pressuposto de subsidiar até 60 assentos por voo, a maior oferta de voos iria permitir a redução dos preços das passagens em até 25%, em alguns trechos, e de até 33 minutos em tempo médio de voo por passageiro porque haverá menor necessidade de conexões.

“Agora, sem o limite de 60 assentos por voo tudo o que foi projetado perde sentido”, afirma Antonoaldo Neves. Ele diz que as companhias aéreas vão redesenhar as respectivas malhas aéreas porque os subsídios vão mudar a lógica econômica de cada rota.

“Por que colocar mais voos entre dois aeroportos regionais operados com aviões menores se eu posso optar por um avião maior, com menor frequência, entre aeroportos ainda regionais, mas maiores, se vou receber mais subsídio com o avião maior?”, aponta o presidente da Azul.

Procuradas, TAM, Gol, Avianca e Embraer não colocaram um porta-voz para comentar o assunto até a publicação desta nota. 

Anteriormente, tanto Gol como TAM haviam exposto por meio de notas e de executivos a intenção de encomendar aviões da Embraer.

No caso da Gol, como alternativa a cerca de 20 aviões da nova geração dos Boeing 737, os 737Max-7, que a companhia planeja encomendar nos próximos cinco anos em um negócio que pode somar US$ 1,7 bilhão.

E no caso da TAM, os E2 da Embraer seriam alternativas aos Airbus A319.

Até a apresentação para votar o texto que regulamenta a MP, o senador pode alterar a redação. Uma vez aprovado, o texto segue para votação na Câmara dos Deputados. A MP 652/2014 tem validade até 24 de novembro. 

Um pedido de vista coletivo na quarta-feira passada, em razão de acordo de lideranças, adiou para amanhã, terça-feira dia 11, a votação do parecer do senador Flexa Ribeiro. 

O líder do governo do Congresso, senador José Pimentel (PT-CE), afirmou que o pedido de vista foi um acordo com a liderança do PMDB da Câmara, “que exigiu que a matéria fosse discutida e votada na próxima semana, para não ser derrubada no Plenário”.