A montadora alemã BMW deu a arrancada para, em menos de dois anos, começar a produção de carros no norte de Santa Catarina. Depois de assinar, na semana passada, o protocolo de intenções que prevê o investimento no Estado, o grupo diz que vai iniciar ainda neste mês a preparação do terreno de 1,5 milhão de metros quadrados que vai abrigar a fábrica na cidade de Araquari.
As máquinas já foram deslocadas ao local para o trabalho de terraplenagem e, se tudo sair como prevê a empresa, a cerimônia da "pedra fundamental" será realizada em outubro ou novembro, marcando o início das obras civis. A marca ainda planeja aproveitar o evento para, enfim, revelar quais modelos serão fabricados no país, um segredo guardado pela montadora apesar das especulações de que os carros serão da Série 1, Série 3 e X1 - os mais vendidos pela BMW no Brasil.
Para comandar a implementação do projeto, a companhia escalou um executivo com 18 anos de casa. Arturo Piñeiro assumiu no início do mês a presidência da subsidiária no Brasil, após dirigir negócios do grupo na Espanha e nos Estados Unidos, além de uma passagem relativamente curta - entre 2008 e 2009 - por Buenos Aires, de onde comandou as operações da América do Sul.
O nome hispânico e a trajetória profissional podem causar confusão, mas Piñeiro é brasileiro, nascido em São Bernardo do Campo (SP), berço também da indústria automobilística nacional. Sua carreira só começou na Espanha porque o pai, espanhol, decidiu voltar à Europa no fim da década de 80, após sair de uma sociedade numa concessionária da General Motors (GM) em Lençois Paulista, interior de São Paulo.
A partir daí, Piñeiro trabalhou para uma rede de revendas de caminhões, gerenciou a divisão de vendas e marketing da Peugeot na Catalunha e, em 1995, foi contratado para chefiar a Motorrad - a divisão de motos da BMW - na Espanha. Dentro do grupo alemão, o executivo ainda foi presidente da BMW Financial Services, braço financeiro da companhia, na região Ibérica, até se mudar para os Estados Unidos, onde foi chefe da divisão de motos e - depois do intervalo na Argentina - comandou as operações das regiões central e oeste americana. Estava morando em Los Angeles antes de chegar a São Paulo no dia 2 deste mês.
"Posso falar que minha trajetória profissional no Brasil só está começando agora", afirma Piñeiro, que tem encarado uma agenda intensa desde que voltou ao Brasil com um contrato de pelo menos três anos. Sua primeira missão será construir a fábrica, com investimento orçado em € 200 milhões. "Queremos fazer o primeiro carro até o fim de 2014", afirma Piñeiro.
Depois disso, o objetivo será equivalente a colocar o Brasil no mapa da BMW. No ano passado, as vendas do grupo no país - entre as marcas BMW, Mini e Rolls-Royce - somaram 10,7 mil automóveis, o que não chega a ser 1% do volume global da companhia - superior a 1,8 milhão de carros. Piñeiro diz que a marca, mesmo em mercados pequenos na Europa, consegue vender mais de 10 mil carros.
Mas, com a fabricação local, o Brasil passa a ter potencial para chegar entre os dez principais mercados do grupo. Pelo menos no início, toda produção de Araquari será destinada ao mercado brasileiro. Não há planos no momento de usar o Brasil como plataforma de exportação, mesmo para mercados do Mercosul. Os países latino-americanos, diz Piñeiro, continuarão sendo abastecidos pelas fábricas dos Estados Unidos, da Alemanha e da África do Sul.
A capacidade na unidade catarinense será de 32 mil carros por ano - ou seja, o triplo do que o grupo vende atualmente no país. E, segundo estimativas divulgadas pelo governo de Santa Catarina, o faturamento da BMW vai passar de R$ 2 bilhões por ano com a nova fábrica. Para alcançar esse novo patamar, a direção da BMW aposta na ascensão social e na maior competitividade de seus carros quando a linha estiver pronta.
Piñeiro confirma que a produção local abre a possibilidade de a empresa praticar preços "um pouco mais baixos", mas desde que isso não comprometa o padrão de qualidade da marca. "Teremos no Brasil os mesmos carros que vedemos na Alemanha e isso tem um custo", afirma.
Segundo o executivo, a nova política automotiva do governo - estabelecendo restrições a montadoras sem atividades industriais no Brasil - foi um empurrão para a BMW investir no país. Mas, diferentemente do que fizeram marcas como Hyundai e Toyota quando se instalaram no interior paulista, a montadora alemã não trabalha para levar ao entorno da fábrica alguns de seus fornecedores de autopeças internacionais. "A maioria dos fornecedores que temos no mundo já está presente no Brasil", justifica Piñeiro.
O novo regime automotivo concede níveis de nacionalização mais confortáveis para montadoras de luxo, dada a maior dependência de tecnologia importada de seus produtos. Porém, em contrapartida, o governo, nesses casos, cobra investimentos mínimos nos projetos de produção local.
O projeto de Araquari será parcialmente financiado pelo BRDE, o banco de desenvolvimento dos três Estados do Sul do país, que vai repassar R$ 240 milhões para a BMW. Segundo Paulo Bornhausen, secretário de desenvolvimento econômico de Santa Catarina, a subvenção será amortizada com o recolhimento de ICMS durante um prazo de, no máximo, oito anos a partir da inauguração da fábrica.