Em um quadro de retomada moderada da produção e sinais de que o emprego industrial começa a reagir lentamente, a folha de pagamento real da indústria caminhou em sentido contrário e deu mostras de perda de fôlego ao subir apenas 0,1% entre setembro e outubro, feitos os ajustes sazonais, período em que o pessoal ocupado assalariado nas fábricas aumentou 0,4% e o número de horas pagas pelo setor subiu 1,1%. Os dados são da Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salário (Pimes), divulgada ontem (11) pelo IBGE.
Em agosto sobre julho, com ajuste, a folha de pagamento real havia crescido 2,1%. Esse índice, que foi completamente devolvido no mês seguinte, resultou em estagnação dos salários reais no trimestre encerrado em outubro. Nos 12 meses terminados em outubro, o avanço da folha de salários é mais robusto, de 3,2%, mas vem desacelerando desde outubro de 2011, quando crescia a um ritmo de 5%. Para economistas, esse movimento já indica uma pressão de custos menor sobre a indústria e conta como mais um ponto a favor no cenário de recuperação modesta projetado para esse setor.
O custo unitário do trabalho, que mede o peso da mão de obra sobre cada unidade produzida, também está estacionado há três meses na indústria de transformação, calcula Alexandre Andrade, da Votorantim Corretora, enquanto, na indústria geral, recuou 0,8% nos três meses encerrados em outubro. Para o economista, o comportamento é reflexo de alguma reação da produtividade, já que a produção inverteu a trajetória de queda no último trimestre enquanto seguia reduzindo a conta-gotas seu nível de emprego.
"Junto aos incentivos concedidos pelo governo, o controle de custos de mão de obra tende a ter um efeito positivo sobre a indústria e devemos continuar vendo recuperação nos próximos meses", diz Andrade, embora pondere que o emprego industrial não terá tanto fôlego para crescer no próximo ano, mesmo com o ritmo mais forte da produção. O setor, lembra ele, reteve mão de obra durante vários meses em que a produção esteve em queda, temendo pagar salários ainda mais altos para recontratar esses funcionários num momento de aceleração da atividade.
Ainda que nos últimos 12 meses os salários tenham crescido muito acima da produtividade, que encolheu 0,8% no ano encerrado em outubro, diz Rafael Bacciotti, da Tendências Consultoria, a expectativa é de ganho para a indústria daqui em diante, já que, com a retenção de mão de obra observada no primeiro semestre, a produção deve crescer em ritmo maior do que as horas pagas nos próximos meses. "O arrefecimento na folha de pagamento é algo que deve perdurar um pouco mais e ajudar na questão de perda de competitividade da indústria", avalia.
Andrade destaca que a tendência de moderação na folha de salários não vem de setores contemplados com o regime de troca da contribuição previdenciária por uma alíquota fixa sobre o faturamento: na média dos segmentos têxtil, de vestuário e de calçados, o custo unitário do trabalho aumentou 0,5% no trimestre terminado em outubro, contra os três meses encerrados em setembro, segundo seus cálculos, enquanto a folha de pagamento real caiu 0,2%. "O consumo ainda está sendo atendido por importados em boa parte desses setores, mas, mesmo assim, a medida de desoneração ainda é recente para ter tido algum efeito."
Na indústria automobilística, que conta com redução do IPI desde maio, o quadro é inverso. O analista da Votorantim calcula que a folha de pagamento real diminuiu 0,5% no índice de média móvel trimestral no segmento de fabricação de meios de transporte (onde está inserido o setor automotivo), puxada por queda de 2,1% no custo unitário da mão de obra, cenário que reforça a prorrogação do benefício pelo governo no início de 2013, já que a reação da indústria ainda é muito dependente nessa cadeia.
Para Rogério César de Souza, economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), o mercado de trabalho apertado, com baixa oferta de desocupados, não permite concluir que a perda de fôlego na folha de pagamentos da indústria continue sendo observada. Mesmo que esse comportamento se repita nos próximos meses, Souza acredita que representará pouco alívio diante de outros custos do setor.
Em sua opinião, a atual estagnação na folha de salários é mais reflexo de um ajuste no nível de emprego do que resultado de contratações com remunerações menores e, como a perspectiva é de alguma retomada da atividade industrial no próximo ano, ainda que tímida, o emprego industrial deve mostrar crescimento modesto. "A folha estar parada é muito mais consequência de uma redução no nível de emprego", diz. No acumulado de janeiro a outubro, a ocupação nas fábricas encolheu 1,4% sobre o mesmo período de 2011.
Por Arícia Martins/ Valor Econômico