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As boas perspectivas de crescimento do mercado doméstico em comparação ao cenário de crise nas economias desenvolvidas e o custo menor do crédito fora do país levaram as multinacionais brasileiras a trazer um volume substancial de recursos do exterior, nos chamados empréstimos intercompanhias. Em 2011, as entradas no país por meio desse canal superaram as saídas em US$ 21,2 bilhões, fazendo o saldo líquido dos investimentos brasileiros diretos no exterior ficar positivo em US$ 9,3 bilhões, uma vez que as operações para compra de participação em empresas fora do Brasil exibiram saída líquida de US$ 11,9 bilhões, segundo o Banco Central. O resultado causa alguma estranheza, porque o processo de internacionalização das companhias brasileiras está no início e, em tese, o natural seria que o fluxo líquido fosse de saída de dinheiro do país
As matrizes das multinacionais brasileiras receberam em 2011 um fluxo expressivo de recursos de suas filiais no exterior, nos chamados empréstimos intercompanhias. Nessas operações, as entradas no Brasil superaram as saídas em US$ 21,2 bilhões, o que fez o saldo líquido total de investimentos brasileiros diretos no exterior - voltados para atividades produtivas - ficar positivo em US$ 9,3 bilhões, uma vez que o fluxo de compras de participação no capital de empresas lá fora ficou negativo em US$ 11,9 bilhões. Os números são do Banco Central.
O resultado causa alguma estranheza, porque o processo de internacionalização das companhias brasileiras está no começo, e seria natural que as saídas de recursos fossem superiores às entradas.
Há quem acredite que as empresas trouxeram neste ano mais dinheiro das filiais com o objetivo de evitar a cobrança do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nas aplicações em ações e principamente em renda fixa (para aproveitar o diferencial entre juros internos e externos), mas vários analistas têm explicação mais benigna. O dinheiro viria para as companhias investirem em atividades produtivas, uma vez que as perspectivas de crescimento da demanda por aqui são mais favoráveis do que em boa parte do mundo. Os investimentos brasileiros diretos se compõem da soma das operações de participação no capital e dos empréstimos intercompanhias.
Pesquisador do Laboratório de Inovação e Competitividade da USP, Luiz Caseiro diz que a ampliação da presença das empresas brasileiras no exterior aumenta a capacidade de levantar recursos fora do país. Uma das vantagens da internacionalização, lembram analistas, é o acesso a capital com custos mais baixos. Para o presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização (Sobeet), Luís Afonso Lima, num momento em que a economia brasileira oferece oportunidades interessantes de expansão, as empresas tendem a dar preferência a projetos por aqui. "É um recuo tático, não um abandono das operações fora do país."
Caseiro também não vê esse movimento como um retrocesso na fase de internacionalização. Ele lembra que, no caso das operações de participação de capital, as saídas de recursos do Brasil continuaram a superar as entradas em 2011. Isso quer dizer que as empresas seguem aumentando a presença fora do país. Nos últimos anos, companhias como Vale, Petrobras, Gerdau, Weg e Marcopolo ampliaram a atuação no exterior.
Dos US$ 21,2 bilhões que voltaram ao país sob a forma de empréstimos intercompanhias, US$ 15,1 bilhões se referem a operações em que a filial amortiza recursos que haviam sido emprestados pela matriz. Para o professor Antonio Corrêa de Lacerda, da PUC-SP, esse movimento pode confirmar a hipótese de que as empresas decidem trazer recursos das subsidiárias por verem perspectivas mais promissoras por aqui. "É um movimento de trazer parte do dinheiro de volta, mas não de desistir da internacionalização."
Lima diz que as empresas podem "arbitrar" a data de amortização de empréstimos de suas filiais, ou seja, têm espaço para definir quando mandar o dinheiro de volta. Dado que hoje os projetos em várias áreas são mais promissores no Brasil, faz sentido trazer os recursos. "Como se trata de uma relação entre matriz e subsidiária, a tendência é que esses pagamentos ocorram em função de um planejamento da organização de investimentos", reforça Caseiro.
Há ainda uma fatia de US$ 6,1 bilhões do fluxo líquido de US$ 21,2 bilhões de empréstimos intercompanhias para o Brasil que se refere a recursos emprestados às matrizes pelas filiais. Como o custo do dinheiro no exterior é mais baixo, há um estímulo para que as subsidiárias tomem emprestado no exterior e repassem para as sedes investirem em projetos num mercado de maior potencial de crescimento, dizem analistas.
Pesquisadoras do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Julia Braga e Renata Carvalho acreditam que o forte aumento do fluxo de recursos das filiais para as matrizes neste ano pode ter outro motivo. Para elas, as empresas estão buscando opções para evitar a cobrança do IOF nas aplicações de recursos em ações e renda fixa. Em outubro de 2010, a alíquota para a renda fixa subiu de 2% para 6%, e a de ações foi definida em 2%. As pesquisadoras notaram primeiro o aumento dos fluxos de investimentos estrangeiros diretos, que também passaram a apresentar maior volatilidade, característica típica de capitais de curto prazo, como as aplicações em ações e renda fixa.
De fato, o fluxo das filiais no exterior para as matrizes em 2011, de US$ 21,2 bilhões, ficou bem acima dos US$ 15,2 bilhões de 2010 e dos US$ 14,6 bilhões de 2009, embora esses números também sejam expressivos. Segundo Julia e Renata, essas operações perderam fôlego depois que o BC inverteu a mão da política monetária, no fim de agosto, e começou a reduzir os juros. Em novembro e dezembro, por exemplo, saíram do país US$ 400 milhões por esse canal. Com juros menores e IOF agora zerado na entrada de dinheiro para ações (para títulos públicos, permanece a taxa de 6%), há menos incentivo para o uso desse expediente, que elas classificam como "arbitragem regulatória".
As pesquisadoras dizem ainda que a existência de operações para escapar do IOF não exclui um movimento simultâneo de entrada de dinheiro para uso em atividades produtivas. A questão é que o aumento dos fluxos, especialmente no primeiro trimestre de 2011, sugeriu um elemento novo.
Caseiro diz que a hipótese das pesquisadoras do Ipea deve ser levada em conta, mas acredita que a maior parte dos recursos vindos das filiais para as matrizes tende a ir para projetos no setor produtivo. "O IOF aumentou em 2010, e a tendência de alta dos empréstimos de capital das subsidiárias para as matrizes ocorre desde 2007, quando a economia passou a apresentar um ciclo de crescimento mais intenso e sustentável."
Lacerda acha que as duas hipóteses não são excludentes, dando como exemplo uma empresa que tem um plano de investimento a ser realizado em dois anos. Nesse caso, a companhia traz os recursos da filial, aplica o dinheiro na renda fixa e o desembolsa ao longo do tempo, à medida que constrói uma nova fábrica.
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