Quem sujar vai ter de limpar

Política Nacional de Resíduos Sólidos começa a ser analisada pelo senado e também responsabiliza empresas pela gestão do lixo

Imagem: Divulgação

A discussão no Congresso já leva 21 anos, mas finalmente o Brasil está mais perto de ter uma Política Nacional de Resíduos Sólidos. O projeto de lei foi aprovado na Câmara dos Deputados em março, começa amanhã a ser analisado no Senado e se baseia no princípio de que quem produziu o lixo é encarregado do seu destino, trazendo dois conceitos ainda incipientes por aqui: a responsabilidade compartilhada e a logística reversa. De acordo com esses conceitos, todos os envolvidos na geração de resíduos – dos fabricantes dos produtos descartados aos próprios consumidores – devem dividir a tarefa de dar uma destinação adequada a eles.

O projeto terá uma tramitação simplificada no Senado para ser votado antes do período eleitoral. O texto será analisado amanhã por quatro comissões, em uma reunião conjunta, antes de seguir para o plenário. Os senadores podem suprimir trechos, mas não alterá-los. A proposta original, de 1989, recebeu diversas alterações e substitui mais de 100 projetos sobre o tema, apresentados nesse meio tempo. A criação desta lei é uma velha bandeira de entidades ligadas à proteção do meio ambiente.

Hoje, os estabelecimentos que geram lixo perigoso e entulhos de construção devem dar uma destinação adequada aos resíduos. A responsabilpidade compartilhada estende essa obrigação para o resíduo gerado após o consumo dos produtos e a distribui, de forma encadeada, entre fabricante ou importador, distribuidor, comerciante, consumidor e poder público. Na prática, haverá a implantação da logística reversa (ou verde) pelas empresas – a coleta do produto ao fim da vida útil para destinação final ou reciclagem.

O processo será obrigatório para as empresas de óleos lubrificantes, lâmpadas fluorescentes, eletroeletrônicos e embalagens contaminadas. A exigência já vale para pneus, embalagens de agrotóxicos, pilhas e baterias. O texto permite acordos para a adoção de soluções conjuntas por cada setor. As demais indústrias continuam responsáveis pelo seu lixo, ao lado de empresas de saneamento, saúde, mineração, construção civil e produtos agrícolas. Já os consumidores deverão devolver os produtos sujeitos à logística reversa e dispor corretamente o lixo domiciliar para coleta.

Eletrônicos
A logística reversa é uma ferramenta para atacar o problema do crescente volume de lixo eletrônico, consequência do crescimento econômico. De acordo com um estudo das Nações Unidas, feito no ano passado, o Brasil é o terceiro país emergente que mais gera resíduos de produtos eletrônicos. São quase 370 mil toneladas por ano, não muito menos que as 440 mil geradas pela Índia, um país com mais de 1 bilhão de habitantes e que cresceu ao dobro do ritmo brasileiro nos últimos anos. Já no descarte de computadores por habitante, o Brasil é o campeão, com 0,5 quilo contra 0,2 dos chineses.

Alguns fabricantes têm programas voluntários de reciclagem dos seus produtos descartados, mas as ONGs respondem pela maioria das iniciativas. Em Curitiba, a prefeitura cedeu um galpão para o Instituto Brasileiro de EcoTecnologia, que faz coleta domiciliar de eletrônicos, após agendamento por telefone. Os produtos são desmontados e separados. Parte é usada na confecção de kits de robótica para escolas, e a entidade busca parceiros para processar o restante. A tecnologia para reciclagem de circuitos é rara no Brasil. Na semana passada, os vereadores pegaram carona na discussão nacional e aprovaram a logística reversa para a mesma lista de setores.

“Nosso objetivo é incentivar a difusão dessa tecnologia aqui, para que as nossas matérias primas não acabem em outros países. Já fazemos produtos recicláveis, o próximo passo é fazê-los reciclados. Para isso, é indispensável criar instrumentos de incentivo econômico”, julga o diretor de responsabilidade socioambiental da Associação Brasi­lei­ra da Indústria Elétrica e Ele­­­trônica, André Luís Saraiva.

Outra preocupação da entidade é com as metas que vierem a ser estabelecidas pelo governo federal, na regulamentação da lei. Para Saraiva, o setor não tem como se comprometer com metas porque grande parcela dos eletrônicos vendidos não implica em descarte do produto antigo. “A maioria dos compradores de computador não tinha um antes. E quem tinha não o descartou, repassou para terceiros. O brasileiro tem o hábito de estender o prazo de obsolescência dos produtos. É consequência da nossa situação econômica. Mas a relação da logística reversa se estabelece entre fabricante, comerciante e cliente. Se ele quebrar essa cadeia, o processo não funciona”, avalia.

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