Foto: Divulgação
Algumas empresas multinacionais, muitas há décadas operando pelo mundo afora, decidem aportar no Brasil conhecendo nosso mercado e cultura apenas através de almanaques e do vídeo que as companhias aéreas internacionais mostram aos turistas antes do avião aterrissar, imaginam que uma terra selvagem, onde tudo é possível. Concluem que o melhor a fazer é trazer para cá os seus melhores caçadores de negócios: deve haver milhares de boas presas à solta por aí.
Chegam os caçadores: um grande arsenal de ofertas e um jeito especial de fazer as coisas, que mais lembra um safari ou uma expedição. Trazem métodos, padrões, fórmulas e, claro, todo um arsenal de técnicas de vendas e uma boa provisão financeira. Alugam salas nos melhores pontos da selva de pedra, andam por aí com seus vistosos carros alugados e vestimentas da moda e esperam com isso impressionar. Gastam pneus por toda a parte, passam por todos os escritórios e são sempre bem recebidos. Ficam para um almoço no melhor dos casos, no pior só têm tempo para um cafezinho apressado. O próximo passo é atacar as melhores e mais polpudas presas, carregando-as consigo para as matrizes e obtendo rapidamente resultados tão suntuosos como todo o resto. Muita carne para os leões da diretoria.
Apesar de todo esforço não conseguem acertar um tiro sequer: saem de mãos abanando. Depois de algumas semanas sem nenhum resultado, já começam a olhar com desconfiança todas aquelas estatísticas da matriz e as previsões de crescimento para os negócios no Brasil. Mais alguns meses e as provisões acabam. Todos os caçadores voltam para casa de bolsos vazios e com algumas histórias sobre a cultura local e a selva, que em geral não sabem explicar. No fim acabam caindo em descrédito e virando motivo de piadas na matriz, que inevitavelmente demite os caçadores e especialistas em mercados latinos, junto com todos os chefes e executivos locais. Assim como os móveis do escritório, eles vão para a rua.
Outros aparecem como fazendeiros endinheirados: querem plantar para colher. Observam a imensidão e a aparente fertilidade das terras, trazem todo um conjunto de implementos e bons produtos e saem em busca de bons e duradouros relacionamentos, plantando catálogos, realizando seminários, enviando muita mala direta, e, claro, convidando os compradores e empresários para suas suntuosas sedes, repletas de equipamentos modernos e bem adaptados ao que eles acreditam ser a realidade tecnológica do país.
Passa o primeiro ano e todo o esforço resulta em quase nada. No segundo ano os fazendeiros colocam seus chapéus e partem sem ter realizado a colheita. Levam uma longa lista de contatos, visitas e potenciais clientes, mas nenhuma venda que justifique todo o investimento realizado.
Qual a lição que tiramos do conto dos caçadores e fazendeiros que chegam aqui todos os dias?
A lição é simples, a cultura brasileira de negócios pode ser tudo que dizem dela, mas não é uma selva com boas presas esperando para serem caçadas. Não existe em nosso mercado esse tipo de em“presas”. Nem tampouco, apesar da grandeza do país e da extensão de seus negócios, é possível a implementação de uma fazenda onde se vai semear o mercado. Aqui no Brasil o que funciona é o relacionamento de longuíssimo prazo, a honestidade de propósitos e, antes disso, a noção de continuidade que têm os que não buscam apenas oportunidades.
Os brasileiros são avessos a catálogos e a vendedores que chegam em carros suntuosos. São avessos a reuniões, seminários, longas e custosas visitas, reuniões com empresários estrangeiros que chegam aqui de última hora. Isso cheira a imediatismo.Gostamos de relações com pessoas conhecidas, amigos de longa data e que nos tenham acompanhado desde o início de nossas carreiras. Desejamos que essas relações se tornem parcerias.
Assim, nem caçadores, nem fazendeiros de oportunidade têm vez por aqui. Para dar certo no Brasil as multinacionais precisam de gente daqui, com conhecimento de mercado, boa reputação e relações estabelecidas. Mais do que isso, essas pessoas precisam estar dispostas a ampliar esse rol de amizades e a fazer negócios com seriedade, e seriedade, no Brasil, significa antes de tudo o desejo de servir e servir bem por muito tempo, um casamento mesmo. Com amor e paixão pelo que se faz e se vende.
Depois de viajar o mundo todo, às vezes como caçador e em outras como fazendeiro, percebi que o que costuma funcionar em outras partes do mundo aqui não é válido.Nós brasileiros não fazemos negócios, fazemos amigos e bons parceiros e como diz o ditado, amigos se têm poucos em uma vida.
*Carlos E. Paladino Alvino é proprietário da Comércio das Indias Ocidentais Imp e Exp ltda e ex-proprietário da Fornecedora Paulista de Aços ltda, que incorporava a empresa Adley Indústria e Comércio e produzia aços longos e laminados. Também é autor de 3 livros.
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