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Por Márcia Rocha
O paulistano Leonardo Fernandes, de 28 anos, gerente nacional de transportes, ainda era trainee na Unilever, empresa em que trabalha desde 2001, quando o chefe o designou para representá-lo em uma reunião fora do país.
Outro paulistano, Carlos Carvalho, de 42 anos, executivo da GE, também não perdia a chance de falar em reuniões, apresentações e palestras desde muito cedo em sua carreira. Entre Leonardo e Carlos há 14 anos de diferença de idade e uma situação em comum: cada vez mais eles têm sua capacidade de comunicação posta à prova.
"À medida que se progride profissionalmente, as habilidades sociais e políticas ganham mais destaque que a qualificação técnica e operacional", diz José Antônio Rosa, da I&Jr, empresa especializada em desenvolvimento de pessoas e consultoria empresarial, de São Paulo.
Isso ocorre porque está evidente para as organizações que a performance de um profissional, especialmente os de nível executivo, e o resultado que ele gera para o negócio dependem fundamentalmente de como se expõe e se relaciona com os diferentes públicos da corporação (clientes, fornecedores, comunidade, governo, filiais de outros países etc.). Seja qual for seu cargo.
Leonardo foi convocado para representar a empresa em uma reunião com outras companhias na Colômbia, quando era trainee. Carlos, diretor financeiro da área de energia (para a América Latina) da GE, fez carreira aproveitando as oportunidades para falar com Deus e o mundo.
Sabe por quê?
“Logo, descobri que quem se comunica bem se diferencia. Por isso, nunca perdi a chance de me expor, inclusive, em outras línguas”, diz ele, que é fluente em inglês, espanhol e francês.
Portanto, prepare-se. Você pode ser chamado para conduzir uma reunião no lugar do chefe, participar de uma teleconferência com acionistas da empresa ou apresentar um projeto na matriz - em outro país.
Oportunidades de exposição não faltam. É preciso ocupar esses espaços e se tornar hábil para se expressar em vários meios e de várias formas - pessoalmente, por telefone, via email.
“Aliás, o meio escolhido tem influência sobre a mensagem. Senão, a comunicação fica truncada. E-mail e telefone, por exemplo, não são boas opções para cobrar um trabalho. O melhor é conversar”, diz José Ernesto Bologna, presidente da consultoria Ethos Desenvolvimento Humano e Organizacional de São Paulo.
Carlos, da GE, tem esse tipo de sensibilidade. Quando percebe que o papo por e-mail pode virar mal-entendido, convoca uma reunião. E isso, às vezes, significa marcar uma teleconferência, já que grande parte da equipe fica fora do país. “O fato de conhecer todos pessoalmente torna a conversa por telefone mais fácil”, diz.
A complexidade inerente às novas formas de se comunicar tem levado algumas organizações a oferecer treinamento para que seus profissionais falem melhor e se exponham mais.
A Serasa, empresa de dados econômicofinanceiros, com sede em São Paulo, contratou especialistas em 2005 para capacitar 550 executivos - a maior parte gerentes e coordenadores.
“A comunicação é fundamental no nosso modelo de gestão, porque viabiliza o trabalho do dia-a-dia e as inovações. O treinamento nos ajudou a ter gente mais hábil nesse aspecto”, diz Elcio de Lucca, presidente da Serasa. “Agora, todos eles podem atuar como nossos porta-vozes.”
Reinaldo Passadori, diretor do Instituto Reinaldo Passadori de Comunicação Verbal, de São Paulo, que tem 350 organizações como clientes, conta que 37 “novas” empresas procuraram o instituto para treinar seus funcionários, também gerentes em sua maioria, durante 2007.
Quem participa desse tipo de curso aprende a fazer apresentações em público, conduzir negociações, dar treinamentos e liderar reuniões. Ou seja, experimenta situações em que tem uma platéia para mobilizar. Aprende também a lidar com o medo de errar.
“Em uma apresentação em público ou em qualquer outra situação em que você interage com alguém, se desculpe pelo erro e siga em frente”, diz Reinaldo. Se você não fizer isso, vai chamar mais a atenção para seu tropeço e, pior, atrasará a atividade em que estiver envolvido.
Na Unilever, as exigências em torno da habilidade de comunicação vão pelo mesmo caminho. Afinal, trata-se de uma empresa globalizada. “Respeitamos o estilo de cada um e oferecemos apoio quando alguém tem dificuldades de comunicação. Ter essa competência ajuda no trabalho”, diz Vera Durante, diretora de RH.
O apoio vai de orientação para dar feedback a um treinamento sobre como agir durante uma entrevista. Até um superespecialista, que desenvolve uma pesquisa de ponta, não pode mais ficar isolado.
Suas apresentações para garantir os recursos necessários para a continuidade do projeto o obrigam a dialogar bem com outras áreas da empresa e a usar a habilidade de comunicação para traduzir a atividade para públicos leigos internos e externos.
Aqui, vale chamar a atenção para a necessidade de colocar limites aos movimentos que você fizer para aparecer mais. Se expor é bem diferente de atropelar as pessoas, na ânsia de se exibir.
Esse é o lado caricato da comunicação e do marketing pessoal. Ser reconhecido como alguém que tem competência para se comunicar leva tempo e tem a ver com criar seu espaço, dando suas opiniões, sugerindo novas idéias e procurando oportunidades pertinentes ao seu projeto de carreira para se expor.
Para o topo é mais difícil
Naturalmente, se você é ou está prestes a virar um líder, essa habilidade se torna imprescindível. É difícil uma empresa hoje admitir um diretor ou VP que tenha problemas de comunicação.
Daí, os esforços para capacitar os executivos quando eles ainda são gerentes. Mais para cima, o que as organizações fazem é trabalhar aspectos específicos, caso o diretor, o VP ou o presidente ainda se atrapalhem na hora de lidar com as palavras.
No caso dessa turma, uma das grandes preocupações é com a reputação da empresa. “O presidente é a marca da organização”, diz Mauro Lopes, presidente da MVL, consultoria paulistana especializada em comunicação.
Mauro explica que, quando a empresa passa por uma situação delicada e o presidente quer se pronunciar a respeito para os funcionários ou para a imprensa, não deve criar uma versão.
“Há coisas que, por razões estratégicas, não podem ser reveladas. Mas mentir nunca pode ser uma opção”, diz o consultor, que foi contratado em dezembro pela TAM para ajudar a empresa a superar arranhões causados em sua imagem após acidente que matou 199 pessoas em julho de 2007.
Sobre o desafio de recuperar a reputação da empresa, uma pesquisa da Burson-Marsteller, consultoria americana de comunicação corporativa, feita em 2006, mostra que há muita expectativa que o presidente fique acessível à imprensa.
Em outras palavras, em momentos de crise, apareça e fale mais, até a situação voltar à normalidade. O estudo ouviu 685 executivos de 65 países para saber as estratégias que devem ser adotadas, e para 18% deles seria interessante que o CEO se desculpasse publicamente.
A expectativa de todos é que os líderes não apenas tomem as melhores decisões para virar o jogo, mas as comuniquem adequadamente de forma que cada empregado seja capaz de explicar em casa, aos vizinhos e amigos o que está acontecendo.
“Essa comunicação em rede é delicada, pois basta um comentário errado feito por um funcionário para a família e os amigos e a imagem da empresa pode voltar a ser prejudicada”, diz Francisco de Carvalho, presidente da Burson-Marsteller no Brasil.
No seu dia-a-dia
A comunicação cotidiana é tão importante e delicada quanto nesses momentos de crise. Nada mais usual (e complicado) do que um feedback. Ao ganhar uma equipe, surge a necessidade de orientá-la, comunicar metas, explicar processos e alinhar expectativas e estratégias.
Tendo sempre cuidado para não quebrar o que se chama de contrato de confiança. Caso contrário, a interação entre o gestor e o time pode se tornar inviável. A recomendação para as situações corriqueiras do escritório, como feedback, reunião semanal ou a orientação de um novo projeto, é adotar a síntese e estar disposto a ser um bom ouvinte.
O poder de resumir, de ser objetivo, torna qualquer discurso mais eficiente. “Quem consegue ir além da análise e sintetizar os fatos prende a atenção das pessoas”, diz o psicólogo José Ernesto Bologna.
Na Procter & Gamble, quem quiser apresentar um projeto deve ser capaz de escrevê- lo em uma página. Para que ninguém se atrapalhe, é oferecido um treinamento de linguagem escrita dos negócios.
“A habilidade de sintetizar exige conhecimento, capacidade analítica e visão de longo prazo e está incluída em uma das competências que nossos funcionários devem ter”, diz Carlos Relvas, diretor de RH da P&G.
José Ernesto explica que sintetizar tem a ver com foco e com a habilidade de ser transdisciplinar, de saber relacionar diferentes níveis de realidade e de pontos de vista. Parece complicado? Realmente, não é fácil.
O advento da internet anulou o ditado
“quem tem informação tem poder”. Para Vinton Cerf, que é considerado um dos pais da Web e é um dos VPs do Google, o correto é
“quem compartilha informação tem poder”.
Hoje, todos têm acesso a qualquer informação, o que gera um interlocutor muito mais difícil de ser convencido. Para Vinton, o grande desafio é encontrar o que tem relevância.
E não basta apenas saber manejar as ferramentas de busca que filtram e organizam os conteúdos da rede. É preciso ler e estudar muito para desenvolver o senso crítico.
Por esse motivo, além de jornais e revistas, abasteça sua biblioteca com livros sobre filosofia, religião e artes, três grandes áreas do conhecimento. E estude sempre.
Em relação a saber ouvir, coloque- se no lugar dos outros, modulando seu discurso de acordo com seu interlocutor em uma conversa ou negociação.
Uma pessoa com essa qualidade geralmente é boa observadora e tem habilidade para ler nas entrelinhas e compreender a linguagem não-verbal, descobrindo pistas que deixam o discurso mais efetivo.
Para conseguir mexer com as pessoas dessa forma, usando apenas as palavras, sintetizar o discurso, ouvir bem, dar feedback, persuadir parceiros, entusiasmar equipes, impressionar acionistas e satisfazer clientes em uma apresentação, além de conhecer as técnicas que melhoram a comunicação, a receita é treinar, treinar, treinar.
Em outras palavras, aparecer, aparecer, aparecer. Exatamente o que fazem cada vez mais profissionais como Leonardo e Carlos. E outros executivos como Alexandre Lazzari, da IBM, e Gizelda Giampietro, do Banco Real, cujas histórias de sucesso na carreira estão diretamente relacionadas à capacidade de transmitir a mensagem correta para seus públicos.
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