Fonte: Estado de São Paulo - 28/11/07
A Companhia Vale do Rio Doce pretende atrair ao Brasil mais uma siderúrgica, com investimentos de US$ 4 bilhões e capacidade de produção de 5 milhões de toneladas de aço. A previsão é que a nova usina comece a operar a partir de 2010. A informação é do presidente da empresa, Roger Agnelli, que esta semana, esteve na Bolsa de Paris para reuniões com analistas europeus e abriu, por vídeo, o pregão na Bolsa de Nova York.
O executivo garantiu que não tem a intenção de entrar na disputa entre a BHP e a Rio Tinto e que a Vale adotará "cautela" nesse momento em termos de aquisições. O presidente da Vale, empresa que sofre com as invasões do Movimento dos Sem Terra (MST), classificou o movimento como "um caso de polícia" e ainda apelou para que as licenças ambientais sejam dadas pelo governo com maior rapidez, para não frear projetos.
Para concluir, ele disse que quer negociar "preços justos" com a China, principal responsável pela alta na demanda por minério de ferro no mundo. Confira a entrevista:
Como o sr. avalia o impacto da economia mundial no setor da mineração?
A economia mundial passa por um momento de volatilidade alta, principalmente no setor financeiro, e não seria surpresa se o capital para aquisições e fusões caísse bastante. Mas, no setor de mineração, estamos trabalhando no limite da capacidade diante da forte demanda. Isso ocorre ainda em um momento em que não temos equipamentos suficientes para comprar e em que encontrar pessoal especializado está difícil. Não vejo uma mudança desse cenário nos próximos anos. A alta na demanda vem especialmente da China e, por isso, uma eventual redução de crescimento nos Estados Unidos não irá interferir no crescimento mundial.
Diante desse cenário, como estão as negociações de preços do minério de ferro com a China?
Vamos negociar os preços nas próximas semanas. Por mais que tenhamos investido, ainda não está sendo suficiente para suprir a demanda, e isso influenciará no preço do produto. Cabe a nós termos uma negociação justa para obter um preço justo. Não sei se poderemos concluir as negociações ainda este ano. O processo será duro, diante da alta nos preços das commodities.
Com a demanda em alta, não seria o caso de pensar em novas aquisições?
Nossa prioridade é o crescimento orgânico. Temos base para isso. As reservas e planos que temos garantem projetos pelos próximos dez anos. Uma aquisição é um movimento oportunista. Se aparecer uma oportunidade de transação que agregue valor para acionista e reforce nossa liderança, vamos analisar. Mas, ultimamente, pelos preços dos ativos estarem muito elevados diante dos valores das commodities, a hora é de cautela. Temos de olhar o que cria valor.
Surgiram notícias na imprensa de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria pedido que a Vale investisse mais no Brasil. O sr. aceita essa cobrança?
Ele nunca reclamou sobre isso para mim. No Brasil, temos muitas reservas, como de bauxita e cobre, para serem desenvolvidas. É verdade que temos de investir em infra-estrutura. Por isso, temos nossas próprias ferrovias e queremos ampliá-las. Estive com o presidente na semana passada e contei como estamos atraindo siderúrgicas ao País. Somos investidores e fomentadores de investimentos. Já temos três siderúrgicas (uma em parceria com a alemã ThyssenKrupp, em construção, e outras duas em projeto, em parceria com a chinesa Baosteel e com a coreana Dongkuk), no valor de US$ 17 bilhões, e em breve teremos mais uma.
Qual empresa será a parceira nesse novo empreendimento?
Não podemos dizer ainda. Mas produzirá 5 milhões de toneladas e com um investimento de US$ 4 bilhões. Portanto, só a Vale terá trazido ao País quase US$ 22 bilhões em investimentos nessas siderúrgicas.
É possível que seja a indiana Tata? Onde ficaria essa usina?
Conversei em várias ocasiões com eles e gostaria muito que fossem ao Brasil. Entre as localidades, podemos optar pelo Rio de Janeiro, Espírito Santo ou Maranhão.
Até que ponto o abastecimento de energia no Brasil é obstáculo e um risco para o crescimento da Vale?
Em sete anos, inauguramos oito usinas e estudamos uma nova. A energia vai ser determinante para o futuro do Brasil. Mas a falta de energia não é um obstáculo apenas no Brasil, mas em todo o mundo. O consumo cresce num ritmo superior ao fornecimento.
A Vale pretende ser auto-suficiente em termos energéticos?
Não há essa necessidade. O que precisamos é garantir o abastecimento e por isso vamos continuar a investir em energia. Nos investimentos em mineração, abrir uma mina é a parte mais fácil. Hoje, essas minas estão em áreas remotas e vários outros investimentos precisam ser feitos, entre eles o de portos, ferrovias e energia.
A demora do governo em aprovar licenças ambientais é também um obstáculo aos investimentos?
O governo tem uma boa regulamentação. Mas está demorando muito. Essa demora nas licenças está sendo além do razoável e o governo sabe disso. Um projeto de investimento pode estar completo e defendo que tenham o menor impacto ambiental possível. Mas, diante dessa realidade, prazos devem ser dados para a obtenção das licenças. O que não pode ocorrer é uma empresa ter a decisão de investir e não haver garantias de quando uma licença será dada. Para complicar, temos ainda de lidar com políticas diferentes entre municípios, estados e o governo federal.
A Vale também é afetada pelas invasões do MST. Seria trabalho do governo garantir que isso não ocorra?
O MST é um foco de perturbação. Não vamos nos envolver nisso. O MST é um caso de polícia. É uma questão de ordem e de estado de direito.
Roger Agnelli é graduado em Economia pela Fundação Armando Álvares Penteado (Faap). Entre 1998 e 2000, foi diretor-executivo do Bradesco, e diretor-presidente da Bradespar entre 2000 e 2001. Em julho de 2001, assumiu a presidência da Vale do Rio Doce. Antes, tinha sido presidente do conselho de administração da mineradora.
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