Fonte: Ambiente Brasil - 05/11/07
Maurício Novaes Souza (*)
A evolução natural das condições ambientais por um período prolongado de tempo proporcionou a evolução natural das espécies, permitindo o surgimento dos seres humanos. Nesse mesmo período, houve um grande número de espécies extintas pelo fato do ambiente ter-se modificado para condições adversas a estas. Por esse motivo, ao recriar-se um novo ambiente, pode ser gerado, paralelamente, uma série de efeitos colaterais, que poderão facilitar, dificultar ou mesmo impedir o desenvolvimento e a qualidade de vida da humanidade, à medida que alteram os ecossistemas.
Em 1992, durante as reuniões preparatórias para a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), a ECO 92, realizada no Rio de Janeiro, ocorreram intensas discussões sobre as atividades e mecanismos econômicos especialmente capazes de produzirem impactos ambientais e destruírem os recursos naturais. O documento denominado Agenda 21 é resultante dessas discussões, contendo inúmeras recomendações: inclusive aquelas que enfatizam a importância dos governos e organismos financeiros internacionais priorizarem políticas econômicas para estimular a sustentabilidade por meio da taxação do uso indiscriminado dos recursos naturais, da poluição e despejo de resíduos, da eliminação de subsídios que favoreçam a degradação ambiental e da contabilização de custos ambientais e de saúde.
Pode-se afirmar que a idéia de objetivar o desenvolvimento sustentável revela, inicialmente, a crescente insatisfação com a situação criada e imposta pelos modelos vigentes de desenvolvimento e de produção das atividades humanas. Resulta de emergentes pressões sociais pelo estabelecimento de uma maior eqüidade social. Na elaboração da Agenda 21 Brasileira, foi considerada fundamental que se promova à substituição progressiva dos sistemas simplificados convencionais, por sistemas diversificados que integrem os sistemas produtivos aos ecossistemas naturais.
Contudo, percebe-se que as propriedades rurais, a indústria, o comércio e as diversas comunidades, não estão aproveitando efetivamente os seus recursos. Estes incluem seu potencial de transformação dos produtos agropecuários, da matéria-prima florestal e agroflorestal, e da administração de seus resíduos gerados durante os processos produtivos, urbanos e rurais, em produtos de maior valor agregado.
Dessa forma, a tão discutida retomada do crescimento, intensamente discutida nos dias atuais, não é suficiente para a solução dos diversos problemas e não é a melhor alternativa para se chegar ao desenvolvimento sustentável. É necessário que haja, paralelamente à transformação da estrutura produtiva que garanta a recuperação do dinamismo econômico, políticas que promovam uma maior eqüidade social. Os critérios de eficiência econômica, orientados apenas pelas forças de mercado não são suficientes para reduzirem as desigualdades sociais e regionais, típicas no Brasil, e ao uso racional dos recursos naturais.
Como aconteceu na década de 1970, o então Ministro da Fazenda do governo militar Delfim Neto dizia que era preciso fazer o bolo crescer para depois dividi-lo. Nesse período os trabalhadores brasileiros foram convocados a um esforço coletivo, que deu origem ao crescimento econômico e tecnológico que fez do Brasil a oitava maior economia do mundo. O país cresceu e acumulou riquezas, contudo, em ritmo ainda mais acelerado, multiplicaram-se as desigualdades sociais e o empobrecimento dos trabalhadores, particularmente da classe média, que ainda se encontram à espera de sua fatia do bolo. Nesse período, os problemas ambientais se agigantaram.
Essa promessa, que chegou a ser esquecida pela maior parte dos trabalhadores brasileiros da época e é desconhecida dos mais jovens, até mesmo dos estudantes universitários e daqueles do ensino tecnológico, foi retomada em janeiro desse ano pelo presidente Lula por meio Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Atitude traduzida na oferta de R$ 503 bilhões a serem investidos ao longo dos próximos quatro anos para vencer desigualdades ao gerar ambientes favoráveis ao surgimento e desenvolvimento de negócios que irão gerar emprego e renda ao recolocar o país no caminho do crescimento.
Durante o primeiro debate público do PAC apresentado logo depois de seu lançamento pelo senador Tião Viana, o deputado federal Nilson Mourão, um dos maiores entusiastas do programa, fez questão de ressaltar: “esse plano não realizará milagres, mas será executado com realismo e seu sucesso dependerá do comprometimento e empenho dos setores público e privado e de cada um dos brasileiros trabalhando para construir o desenvolvimento econômico sustentável com justiça social”.
Ele fez questão de destacar que o PAC está sendo posto em debate porque não é uma proposta pronta e acabada que estaria sendo imposta pelo governo central, mas exposta como uma determinação que será aplicada na esfera governamental e que se espera seja abraçada pelos demais setores da sociedade. Segundo ele, “o programa está aberto a propostas e sugestões a serem feitos por políticos, empresas, igrejas, a comunidade, enfim, todos que estejam dispostos a nos ajudar a tirar os entraves que estão atrapalhando o desenvolvimento sustentável do Brasil e dos brasileiros”. Comenta ainda, “inclusive, estamos abertos às críticas, desde que elas venham acompanhadas de propostas de solução dos problemas. Não aceitaremos críticas vazias porque quem é responsável sabe que isso não é bom para o país”.
Contudo, o que se percebe, é que apesar de terem ocorrido no Brasil alterações significativas no tratamento das questões ambientais, do ponto de vista político, legal e institucional, o mesmo não pode ser dito do ponto de vista econômico, financeiro, científico e tecnológico, cujas questões estruturais impedem a plena concretização de soluções de curto prazo. Isso porque, procedimentos como aqueles de recuperação ambiental, fundamentais para se garantir a sustentabilidade, exigem também, que sejam revistos os conceitos sócio-econômicos, necessitando, portanto, alterações das políticas públicas.
O fato é que estamos chegando ao final de 2007, e muito pouco tem sido verificado de efetivo relacionado à educação, à extensão, às questões ambientais, entre outros, quando se deseja a sustentabilidade em sua forma plena. A educação ainda não vem recebendo os estímulos que se fazem necessários. Nos interiores do Brasil os organismos de extensão rural ainda são por demais precários e ineficientes: em quantidade e qualidade.
O que se tem verificado é a expansão de áreas desmatadas em todo o nosso País, o aumento de áreas de pastagens degradadas, o crescimento de áreas contaminadas por agroquímicos, a ausência de saneamento básico, entre outros. Na verdade, são os seguintes principais procedimentos necessários para atingir o desenvolvimento sustentável:
• Formação de recursos humanos, em todos os níveis, de onde deverão resultar a universalização do acesso à educação básica e à conscientização da população com respeito aos problemas ambientais;
• Políticas públicas que tenham como prioridade a área social voltada para os recursos humanos, sendo necessário ampliar e intensificar a formação de educadores e profissionais dos mais diversos ramos da ciência;
• Organização e administração dos processos de trabalho nos diversos setores, que deverá contar com a participação dos produtores em decisões que afetem seus destinos;
• Desenvolver políticas específicas em função das peculiaridades regionais e a promoção prioritária de atividades geradoras de empregos, capazes de assimilar e incorporar tecnologias que maximizem o aproveitamento de recursos energéticos locais;
• Estimular cursos de formação, reciclagem e pós-graduação dirigidos aos atores que atuam na área ambiental;
• Promover treinamentos intensivos em gestão de recursos e impactos ambientais, nas empresas privadas e nas instituições públicas;
• Colocar em prática uma nova gestão ambiental, na qual o Estado deve repartir responsabilidades com o setor privado, ONGs e com a sociedade em geral, tanto por questões financeiras, como democráticas, por meio de uma visão abrangente, considerando as questões ambientais e as de desenvolvimento sócio-econômico;
• Intensificar a formação de uma nova geração de profissionais do ensino tecnológico para atuarem diretamente com os produtores / industriais, rurais e urbanos, tendo por base os princípios do desenvolvimento sustentável; e
• Criar sistemas tecnológicos fechados, ou seja, com o mínimo de dependência dos recursos naturais.
Caso tais medidas fossem adotadas, o uso intensivo dos fatores de produção induziria a reprodução de um modelo que garantiria a sua sustentabilidade. Então, é necessária que as políticas sociais trouxessem propostas além da redução da pobreza, como a reforma das organizações e dos programas da área social voltado no longo prazo. Por esse motivo, faz-se necessário as seguintes mudanças nos modelos vigentes de produção e gestão: a) inicialmente, a recuperação ambiental fundamentada em princípios éticos, ou seja, onde exista a real preocupação com o meio ambiente, dentro das propostas do desenvolvimento sustentável; b) a elaboração de tecnologias apropriadas que poupem e conservem os recursos naturais; c) maior rigor na concessão do licenciamento ambiental, condicionando-o à adoção de sistemas de gestão ambiental; d) efetividade no monitoramento e na fiscalização pelos órgãos responsáveis, com a participação de toda a sociedade, politizada e ambientalmente educada, que resultem em punição efetiva aos infratores; e e) políticas públicas voltadas nessa direção e com a necessária determinação exigida nesse momento.
Há de se considerar que a finalidade do desenvolvimento sustentável deverá ter como prioridade as questões sociais que se baseiem em princípios éticos e solidários. Dessa forma, poderá haver uma melhor distribuição dos benefícios do desenvolvimento, reduzindo os casos de pobreza extrema e de iniqüidade sócio-econômica, característicos da sociedade brasileira.
Somente quando esses conceitos estiverem em plena sincronia com os condicionantes ecológicos e com as garantias de viabilidade econômica, será possível construir um projeto voltado às presentes e às futuras gerações, tendo por base os aspectos sociais, ambientais e econômicos, todos fundamentais quando o objetivo é o desenvolvimento sustentável.
* Engenheiro Agrônomo, mestre em Recuperação de Áreas Degradadas e Gestão Ambiental e doutorando em Engenharia de Água e Solo pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). É professor do CEFET - Rio Pomba, coordenador dos cursos Técnico em Meio Ambiente e Pós-graduação em Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável.
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