Fonte: Envolverde - 19/10/07
Uma empresa oferece serviço de reflorestamento para áreas afetadas por erosão, outra assessora fábricas para neutralizar suas emissões de carbono e uma terceira contrata um laboratório ambiental para avaliar danos ecológicos. É a nova geração que valoriza a maneira “eco-eficiente de ser”. Estas companhias exibem seus produtos na Feira de Tecnologias Sócio-ambientais, que funciona desde terça-feira (16) até sábado (20) em Belo Horizonte, paralelamente à VII Conferência Latino-americana sobre Meio Ambiente e Responsabilidade Social, organizada pela consultoria Ecolatina para combater a mudança climática na região.
Ronaldo Gusmão, coordenador da conferência Ecolatina, explicou à IPS que quando a iniciativa surgiu em 1998, seguindo as sugestões da Eco-92 ou Cúpula da Terra. “a questão ambiental passava mais pelos governantes e pela militância ecológica”, enquanto a sociedade e o setor privado pareciam apáticos. “Nessa época, falar a um empresário sobre responsabilidade ambiental ou social era uma má palavra”, recordou. Hoje, porém, a situação e muito diferente. Depois de uma década em que os empresários “começaram a reagir apenas para cumprir as legislações ambientais”, que entraram em vigor nesses anos, se deram conta de que a sociedade também começava a exigir-lhes respostas em sentido de preservação. “Antes, as empresas tinham licença ambiental, mas não da sociedade”, sintetizou.
Nessa conscientização incidiram outros fatores, segundo o coordenador da Ecolatina, que, além da feira, oferece cursos, seminários e oficinas para empresas sobre os desafios e oportunidades do desenvolvimento sustentável para pequenas e médias companhias, bem como ensino de administração de recursos ambientais. Entre outros, Gusmão mencionou o “Informe Nichoas Stern”, deste economista britânico que em janeiro antecipou que as empresas do novo mundo de mudança climática enfrentarão normas ambientais cada vez mais rígidas, a necessidade de utilizar tecnologias para reduzir a emissão de gases causadores do efeito estufa e as modificações nos hábitos de consumo.
Também haverá maior conscientização por parte do consumidor, que gerará respostas dos governos, como a decisão da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, de implementar – como nos Estados Unidos – informação para mostrar ao consumidor quais tipos e marcas de carros emitem menos gases tóxicos. Em São Paulo, maior cidade do Brasil, já há um veículo para cada pessoa. “As companhias estão mudando seus modelos”, destacou Gusmão. Assim como no passado a Revolução Industrial rompeu o modelo de produzir mais, hoje o novo paradigma é contra a revolução industrial”, sintetizou o coordenador da Ecolatina.
Como exemplo, Gusmão citou os comitês de recursos hídricos, formados por comunidades ribeirinhas e as empresas para defesa de cursos de rios em conjunto com representantes de governos estaduais ou municipais. Diante de um determinado problema ambiental do rio, como a contaminação causada pelos resíduos despejados por uma fábrica, pela seca ou a presença de lixo domestico jogado pelas pessoas, o comitê se reúne, estabelece um plano de ação e o executa com os recursos obtidos por seu órgão gesto. Somente em Minas Gerais existem 32 comitês deste tipo.
“As empresas começaram a perceber que a água é um bem que utilizam e que começa a escassear”, disse Gusmão. Ele contou o caso da cervejaria Kaiser, que integra o Comitê do Rio Piracicaba, em São Paulo, porque está consciente de que, se o rio secar ou for contaminado, acabará a matéria-prima com que trabalha, que é a água. uma prática cada vez mais comum e que o Serviço Brasileiro de Assistência à Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) começa a estimular entre seus associados. Em entrevista a IPS, Paulo Alvim, gerente de meio ambiente do Sebrae, afirmou que as empresas “percebem que precisam transformar em oportunidade o que antes era um problema” (a legislação ambiental).
Do ponto de vista empresarial, Alvim disse que o diferencial ecológico, hoje de responsabilidade social, “começa a ser uma estratégia de marketing interessante”, porque “a demanda ambiental de parte dos consumidores é cada vez maior”. Com exemplo desse “diferencial de marketing”, que propõe às pequenas e médias empresas, mencionou o caso de um restaurante que hoje se preocupa em mostrar como funciona sua cozinha, que não deixa lixo na porta e oferece um sopão a uma comunidade carente próxima com os alimentos excedentes do dia.
“A imagem é uma das estratégias de inserção no mercado”, disse Alvim, destacando que se houvesse maiores incentivos referentes a impostos por parte do governo ou de estímulo ao crédito para esses fins “o salto seria ainda maior para criar uma produção e um consumo sustentáveis”. Uma preocupação crescente que se expressa no número de empresas de serviços e tecnologias ambientais, cujo número este ano chegou 79 stands na Ecolatina. Companhias como o laboratório paulista Ecolabor que, como explicou à IPS seu porta-voz, Luiz Augusto S. Júnior, se especializa em analisar água, solos e resíduos para empresas ou consumidores que solicitam seu trabalho.
A Ecolabor, que diz ter aumentado sua carteira de clientes a partir do aumento das exigências ambientais por parte do governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, citou o caso de uma empresa do Pará que os contratou porque os pescadores reclamavam que seus dejetos estavam matando os peixes. O laboratório detectou que na realidade a contaminação do rio era causada por um tipo de bambu que os pescadores retorciam na água e que soltava toxinas. “Descoberto o problema, a empresa e os pescadores resolveram seu problema”, disse Júnior.
É o caso também da Oksigeno, empresa de Minas Gerais que assessora companhias para neutralizar suas emissões de carbono. Feito o diagnostico, “quando não há maneira de reduzir esse emissão, se propõe à empresa reflorestar para compensar esse impacto negativo”, disse à IPS Itamar Melgaco, da Oksigeno. A Deflor é outra companhia especializada nestes novos serviços ambientais. Luciana de Oliveira Matos, sua consultora ambiental, explica que tem uma enorme carteira de clientes, como grandes companhias de mineração, que os contratam para reflorestar áreas de extração afetadas pela erosão.
O serviço de recuperação de florestas da Deflor inclui diagnostico, o cultivo de espécies e a utilização de uma tecnologia especial: fibras naturais de coco e vime que ajudam na tarefa de reflorestamento retendo umidade, evitando desmoronamento de terra pela erosão e fornecendo suplementos nutritivos à terra. Trata-se da expansão de serviços ambientais às pequenas e médias empresas, que já começavam antecipar grandes indústrias como a FIAT, também com um stand na feira da Ecolatina. Entre outros serviços ambientais, a esta montadora, com sede em Betim (MG), tem um centro de pesquisa tecnológica ambiental que permite serviços como a reciclagem de 93% de seus resíduos e que elabora atualmente o protótipo de um automóvel “carboneutro”.
“Oportunidades e desafios do desenvolvimento sustentável para as micro e pequenas empresas”, tema do seminário da Ecolatina coordenado por Beatriz Bulhões, diretora do Centro Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds). Entre 1999 e 2004, as empresas assistidas pelo Cebds investiram R$ 6,3 milhões em melhorias de instalações com fins ambientais e tiveram uma redução de gastos de R$ 23,6 milhões, destacou Bulhões. Um princípio que o Cebds chama de “eco-eficiência” baseado no conceito de “produzir mais e melhor com menos”. E que, além dos benefícios considerados intangíveis, como a reputação, a marca, a ética e a transparência empresarial, produz muitos outros que são concretos.