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A corrida mundial por carros elétricos é um fato. No Brasil, o etanol ajuda a contribuir para uma mobilidade mais sustentável - o desafio é grande, mas a existência dos carros flex ajuda a consolidar essa posição diante dos preços atuais das baterias - mas outras regiões do mundo ainda não podem contar com essa alternativa. Especialmente América do Norte e Ásia. De olho nas necessidades para além do Brasil, a Sigma Mineração investiu na exploração de lítio no Brasil e hoje conta com clientes de peso no mercado automotivo, como Volkswagen, GM, Stellantis, Porsche e Audi.
Até agora, a companhia de origem canadense listada na Nasdaq já investiu R$ 560 milhões em uma planta para exploração de lítio com fins de aprovação regulatória do material coletado no local, tarefa que a companhia cumpriu ao longo de três anos. Agora, com as aprovações garantidas, a companhia anunciou investimento total de R$ 2,3 bilhões para aumentar o tamanho da planta atual, previstos para serem aplicados no país até 2023.
Até hoje, a Sigma já encontrou mais de 30 milhões de toneladas (confirmadas) de lítio de alta pureza em dois dos nove principais sites deles. Esse pode ser considerado um diferencial da companhia diante do setor, uma vez que as plantas de lítio podem demorar, em média, de cinco a oito anos para atingir a capacidade completa de exploração - ou seja, conseguir extrair toneladas e mais toneladas em menos de cinco anos já é um grande avanço.
Por enquanto, o principal objetivo é, claro, garantir o atendimento a todos os clientes. Atualmente, a empresa já tem contratos firmados com Volkswagen, GM, Stellantis, Porsche e Audi. Além de LG e Mitsui.
“O volume da primeira planta não é algo de ‘laboratório’. Investimos, inicialmente, o suficiente para ter uma área igual à do maior produtor de lítio do Brasil, que vende o minério para fabricantes de lubrificantes. Agora, vamos investir mais ainda para aumentar a área do que já temos em 20 vezes e garantir a escala comercial”, diz Ana Cabral-Gardner, co-presidente executiva da Sigma Lithium, à EXAME.
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Questionada a respeito de demanda local para a oferta que a Sigma produz, Ana afirma que a necessidade do Brasil para o minério, falando especificamente de baterias, é bastante reduzida, uma vez que o país é líder mundial na produção de biocombustíveis, com destaque para o etanol, que está presente em mais de 88% da frota local. Um comportamento bastante diferente do apresentado nos EUA, em que 91% dos veículos utilizam combustíveis “sujos”, como gasolina e diesel.
Para se diferenciar em um ambiente de alta competição, que inclui concorrentes gigantes como as mineradoras Albermarle, Jiangxi Ganfeng Lithium Co (chinesa que oferece o componente para a Tesla) e Tianqi Lithium, que controla mais de 46% da produção global de lítio, a Sigma aposta em um fator cada vez mais valorizado por empresas e, inclusive, motivo de discussões globais como a COP26: ESG.
Falando de forma mais clara, a companhia, que tem um valor de mercado de aproximadamente 814 milhões de dólares, segundo a cotação desta sexta-feira, 5, investiu em uma “mineração verde” do lítio na região do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. Na prática, a planta não utiliza nenhum componente químico para a purificação de lítio, consegue reutilizar cerca de 90% da água consumida no local e utiliza um método de empilhamento de rejeitos a seco - evitando, assim, o uso de barragens como as da Samarco, que romperam em Mariana e em Brumadinho.
Nas palavras de Ana, o que a mineradora faz é atuar como uma “cleantech”. Apesar de não usar nada exatamente inédito na própria operação - já que boas práticas como as citadas acima já existiam -- a companhia afirma ter aperfeiçoado o que já era considerado bom para obter os resultados que teve. Para isso, investiu em digitalização, que reduz a interferência manual em todo o processo, gerando mais eficiência e dependendo menos da função do “operador de planta”, ou operador de processo mineral, para garantir que o processo de extração ocorra dentro das especificações exigidas.
Com “encomendas” de gigantes ao redor do mundo, Ana ressalta que o principal diferencial que a Sigma Lithium consegue oferecer para o Brasil é o desenvolvimento socioeconômico da região em que atua.
“O Vale do Jequitinhonha tem um Índice de Desenvolvimento Humano de 0,66, próximo aos níveis de Bangladesh. Com o investimento da Sigma por lá, temos um potencial de geração de renda para a região de 320 milhões de reais. Até agora, geramos 250 empregos e devemos gerar mais de 500 empregos indiretos no próximo ano”, diz Ana.
A forma de atuação da empresa foi transformada num case de sucesso, apresentado nesta sexta-feira na COP26, realizada em Glasgow. Para o evento, a companhia levou uma delegação local para contar mais sobre os efeitos da presença da Sigma no Vale do Jequitinhonha.
Segundo as estimativas da Sigma, o Brasil já captou cerca de US$ 0,5 bilhão em investimentos na cadeia do lítio. Contudo, o valor, que está longe de ser irrisório, ainda representa uma pequena porção dos US$ 20 bilhões de investimentos ao redor do mundo realizados para exploração do minério.
Mesmo assim, outras empresas que atuam no mesmo segmento já estão se mexendo para mobilizar esforços de exploração de Lítio. A AMG Mineração, por exemplo, anunciou que vai investir R$ 782 milhões em uma planta de hidróxido de lítio em Minas Gerais, assim como a CBMM, que investiu R$ 72 milhões em uma startup que desenvolve materiais avançados para baterias de íons de lítio -- isso sem esquecer que a companhia firmou uma parceria com a Volkswagen Caminhões e Ônibus para desenvolver baterias para caminhões nos próximos anos.
Ampliando o olhar para além da cadeia de extração em si, dados do Financial Times mostram que o Brasil captou R$ 2 bilhões de investimentos em tecnologia entre 2020 e 2021, um valor que foi de R$ 9,7 bilhões para nossos vizinhos argentinos e de R$ 10,8 bilhões para os chilenos, campeões de arrecadação na América Latina.
“Queremos, cada vez mais, que empresas possam realizar iniciativas como essa e entendemos que, para isso acontecer, é necessário que o Brasil possa promover segurança jurídica para a atuação das cleantechs. Colocamos o Brasil no mapa e somos muito orgulhosos disso, mas acreditamos que é possível fazer mais”, afirma Ana.
Demanda para isso, existe. Num momento em que o mundo todo tem preocupações cada vez maiores com a emissão de gases, o preço do lítio dispara - e, é claro, as companhias relacionadas a esse minério enfrentam também um bom momento. Para ter uma ideia, o preço da commodity na China disparou 398,7% de um ano para cá, de acordo com estimativas do site Trading Economics.
Falando das empresas, a Standard Lithium Ltd. (SLI) viu o preço de suas ações aumentar 250,1% no último ano, um percentual similar ao da própria Sigma Lithium, de 256,1%. De acordo com informações do WSJ, as ações da Albemarle são negociadas por 51 vezes os lucros previstos, comportamento similar à da Livent, uma rival menor, que negocia a 89 vezes.
Por enquanto, não há expectativas de que os preços baixem tão cedo. Isso porque, primeiro, estimativas da IHS Markit apontam que a demanda pelo minério deve crescer 22% ao ano entre 2020 e 2025 (percentual que era de 25% entre 2015 e 2020).
Em segundo lugar, apesar do lítio ser relativamente abundante, o processo de extração e purificação do minério está longe de ser simples -- e quem saiu na frente primeiro para conquistar esse mercado hoje está em maior vantagem, como é o caso da Ásia. Ainda assim, nem tudo está perdido. E há chances para o Brasil conseguir certa vantagem nesse processo. Apostando na extração “verde”, companhias têm um argumento a mais para brigar de frente com mineradoras maiores, que podem ser favorecidas inicialmente por questões geográficas para parcerias com montadoras.
Ainda que algum relacionamento com a China possa ser necessário, o Brasil começa a dar sinais de que pode entrar, com força, na disputa global por um mercado cada vez mais aquecido.
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