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Apesar da profunda e persistente contração do mercado nacional de caminhões, os representantes dos principais fabricantes instalados no Brasil seguem acreditando na retomada dos negócios, com expectativa de que as vendas daqui a alguns anos atinjam nível acima de 100 mil unidades/ano – o dobro do patamar atual –, com exportações que deverão representar de 30% a 50% da produção, dependendo da montadora. Contudo, todos concordam que o grau de incerteza política continua muito alto no País, o que atrasa a recuperação econômica que realimentaria o setor. Essa é a média das opiniões de seis executivos de alto escalão da indústria reunidos no seminário Caminhos para a Retomada, realizado na terça-feira, 13, pela Anfavea, a associação dos fabricantes, para tomar o pulso do segmento de caminhões.
A realidade, no entanto, mostra-se bem mais dura do que o conjunto das esperanças. O mercado brasileiro de caminhões está 70% abaixo do recorde de 2011, quando 173 mil unidades foram vendidas, contra apenas 51 mil em 2016. As exportações voltaram a crescer, mas ainda ficam 13% menores dos 27 mil embarques de 2011, com 21 mil caminhões exportados no ano passado. A expectativa para 2017 é de 24 mil vendas externas. “Ainda que modesto, será um crescimento, o que é um alento, mas ainda muito aquém do necessário para ocupar a capacidade instalada da indústria, de 422 mil caminhões e ônibus por ano”, pontuou Antonio Megale, presidente da Anfavea, que apresentou os números do setor antes de abrir os debates com os executivos.
O pico de produção de 224 mil veículos comerciais pesados alcançado em 2011 caiu 66%, para 61 mil fabricados em 2016, e deve crescer para 76 mil este ano, graças ao mercado externo. “A situação é dramática, considerando que a indústria é capaz de fazer bem mais do que está fazendo. A ociosidade passa de 80%”, destacou Megale. “A tendência de trajetória do mercado doméstico de caminhões vem melhorando, começou com queda de 33% em janeiro e no acumulado de cinco meses até maio esse porcentual passou a 19,4%. Melhorou, mas o desempenho continua pior do que 2016, que já foi um ano dramático”, avaliou.
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Megale ponderou, no entanto, que existem fatores reais de recuperação, como a safra recorde de 232 milhões de toneladas de grãos, a volta do crescimento do PIB, “ainda que muito timidamente”, e o horizonte de retomada de obras de infraestrutura. Mas diante das incertezas políticas a confiança do empresário, embora tenha melhorados nos últimos meses, permanece insuficiente para voltar a investir em renovação da frota de caminhões. “As vendas de caminhões dependem da retomada da economia, que depende da retomada da confiança, que depende da continuidade das reformas, da estabilização do ambiente político e de mais previsibilidade sobre o futuro”, elencou o dirigente.
Cenários
“Em seis anos aqui, nunca vi um desejo tão grande do cliente em comprar quanto agora. Antes existia o incentivo de aquisição com financiamento barato, nem sempre havia necessidade. Mas hoje muitos fecham o negócio e desistem de assinar o contrato devido às incertezas do País”, conta Michael Kuester, presidente da DAF no Brasil, que decidiu investir no País no boom do mercado e inaugurou sua fábrica em Ponta Grossa (PR) em 2014. “Achamos que estávamos investindo em um país estável e organizado, com leis, nos enganamos, mas seguimos acreditando na retomada no futuro”, afirmou.
Para todos os seis executivos participantes do painel, o cenário de retomada da indústria de caminhões no País passa, necessariamente, pelo aumento da previsibilidade das políticas públicas de regulação do setor, incluindo linhas de financiamento, ganho de competitividade e incentivo à exportação. “Precisamos parar com políticas protecionistas e exportar mais”, define Fabiano Todeschini, presidente da Volvo Bus América Latina. “Mas para isso é preciso ganhar competitividade, atualmente o Brasil exporta impostos e perdemos mercados aqui na América do Sul para a Volvo na Suécia”, destaca.
“Na crise temos oportunidade de nos ajustar e aumentar a competitividade. Deixar o mercado fechado será mortal para a indústria. É preciso importar mais para exportar mais, olhar no longo prazo e incentivar exportações com redução do custo Brasil representado pela legislação trabalhista restritiva e juros altos”, defendeu Philipp Schiemer, presidente da Mercedes-Benz do Brasil.
Para o vice-presidente de vendas e marketing da MAN Latin America, Ricardo Alouche, tanto mercado interno quanto exportações têm condições de crescer muito. “Ao contrário de muitos que dizem ter existido uma bolha incentivada por financiamento barato em 2011, nós da MAN acreditamos que é sim sustentável um mercado acima de 170 mil caminhões por ano. O Brasil tem tudo para voltar a esse patamar porque há muito por fazer aqui, certamente os atuais 50 mil/ano não representam o tamanho real deste mercado. Concordamos que essa retomada acontecerá mais para frente, mas quando acontecer virá forte e poderá criar gargalos. Os fornecedores ajustaram tanto a produção para baixo que hoje já temos falta de algumas peças. Por isso precisamos de previsibilidade, para balancear melhor a cadeia toda”, diz.
O executivo acrescentou ainda que o objetivo da MAN é exportar de 40% a 45% da produção. “É um patamar sadio para absorver possíveis quedas das vendas domésticas.” Para Schiemer, da Mercedes, esse porcentual deve ser ainda maior, em torno de 50%, para ocupar a capacidade instalada da indústria.
João Pimentel, diretor geral da Ford Caminhões, avalia que a retomada do setor para número acima de 100 mil unidades/ano é certa, “só não sabemos quando isso vai acontecer”, pontua. “O problema é que todo dia acontece algo que desestabiliza e compromete a confiança e empresários postergam as compras”, diz. “Enquanto isso temos de usar esse tempo para fazer a lição de casa, para nos tornarmos mais competitivos. Acho que muitos já fizeram isso e quando o mercado retomar estaremos mais competitivos. A preocupação maior é com a rede de revendas, muito difícil de sustentar com quase quatro anos de crise profunda”, pondera.
Pimentel também defendeu a adoção urgente de um programa de inspeção e renovação da frota nacional de caminhões, que hoje tem quase 230 mil veículos acima de 30 anos de idade, com grande impacto negativo no aumento da poluição atmosférica e na segurança, pois são mais propensos a causar acidentes. “A renovação seria muito salutar para a indústria e toda a sociedade”, lembrou.
“O tamanho do mercado (de caminhões) certamente não é de 50 mil/ano, mas dificilmente será possível chegar a 200 mil sem uma política de inspeção e renovação da frota. Sem isso, deverá chegar de 100 mil a 120 mil, com exportação em torno de 30% da produção”, acredita Marco Borba, diretor geral da Iveco, marca de caminhões da CNH Industrial.
Por fim, Alouche, da MAN, lembrou que outro grande desafio dos fabricantes de caminhões será a retomada de preços, que segundo ele estão defasados de 25% a 30% desde a adoção, em 2012, de tecnologia Euro 5 para redução de emissões. “Precisamos recuperar essas margens para gerar faturamento e manter investimentos”, disse.
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