Indústrias substituem Argentina por outros países da América Latina

Com a queda de praticamente 30% das exportações brasileiras para a Argentina, o papel de outros países latino-americanos ficou mais importante como destinos dos manufaturados brasileiros. Economias como México, Colômbia, Chile, Peru e Equador passaram a entrar numa posição mais central no radar da indústria exportadora. Individualmente esses cinco países são mercados ainda pequenos na comparação com a Argentina, mas no conjunto passaram a ganhar maior força.

As exportações brasileiras de manufaturados para os cinco países somaram US$ 8,4 bilhões até outubro, o que equivale a quase 80% dos US$ 10,8 bilhões em vendas do mesmo tipo de bem aos argentinos. No mesmo período do ano passado, os embarques para esses cinco latinos representavam 57,5% das vendas para os argentinos. Além do setor calçadista, empresas como WEG, Romi e Metalplan apostam mais em pelo menos alguns dos cinco mercados.

A mudança na participação relativa desses destinos acontece não somente pelo recuo de quase um terço nas vendas aos argentinos, mas também pelo crescimento de exportação a países como México e Colômbia. A exportação de manufaturados cresceu 3,63% e 2,87% respectivamente, de janeiro a outubro, na comparação com iguais meses de 2013. O crescimento não é explosivo, mas chama a atenção num ano em que, na mesma comparação, a exportação total de manufaturados brasileiros amarga queda de 10,5% até outubro.

Nem todos os cinco países latino-americanos, porém, tiveram resultados acima da média da exportação brasileira de manufaturados. As vendas ao Equador ficaram praticamente estáveis, com variação positiva de 0,58%. As vendas de manufaturados a chilenos e peruanos caíram bastante, com recuos respectivos de 15,2% e 10,1%. A empresas têm expectativa de que o conjunto de países ganhe importância no médio e longo prazos enquanto há maior reticência em relação à recuperação argentina.


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Com a recuperação lenta da demanda americana e mais ainda dos países europeus, as economias emergentes e geograficamente mais próximas passaram a estar mais perto do centro das atenções para elevar embarques. A trajetória de forte desvalorização do real neste segundo semestre é outro impulsor desse movimento.

"A Colômbia é nosso 'target'. Já foi foco agora em 2014, porque fizemos uma aquisição na Colômbia. E no Equador abrimos um escritório no ano passado", diz Gustavo Iensen, diretor internacional da WEG. A ideia é abrir novos mercados e aproveitar oportunidades. O executivo também cita o Peru como mercado promissor. "São, na verdade, países muito orientados à mineração, com produto afetado pela queda de preços no mercado internacional e nos quais ainda há muito investimento por fazer. Mesmo assim são mercados que podem ser interessantes."

Iensen explica que o maior mercado de exportação para a empresa atualmente são os Estados Unidos e os países da União Europeia. O terceiro mercado, diz o executivo, são os países da América do Sul. Com sinais ainda contraditórios da economia americana e a desaceleração ou lenta recuperação de países europeus, diz Iensen, a atenção para destinos mais próximos, na América do Sul, se intensificará no próximo ano.

A expectativa, diz Iensen, é que a desvalorização do real frente ao dólar se intensifique no ano que vem e possibilite maior recuperação das exportações no médio e longo prazos. Em 2014, a exportação deve ficar abaixo da meta para o ano, embora a alta do dólar tenha propiciado uma melhora na consolidação das receitas em reais. Até o terceiro trimestre, o crescimento da receita de exportação em reais ficou em torno de 12%.

Livaldo Aguiar dos Santos, presidente da fabricante de bens de capital Romi, também considera promissores mercados como Peru, Equador, Costa Rica, Colômbia e principalmente México, onde a empresa tem uma subsidiária aberta há cerca de três anos. Para Santos, esses países podem compensar ao menos parte da perda com a Argentina. "Claro que esses mercados, principalmente Equador, Peru e Costa Rica, por exemplo, são bem menores e sozinhos são pouco representativos. Mas as exportações estão acontecendo e no conjunto são importantes."

Segundo Santos, as exportações da Romi ganharam maior fôlego a partir do segundo semestre puxadas pelas vendas à Europa e também à America Latina. Até junho, lembra, a receita de exportação em reais da Romi cresceu 11% na comparação com iguais meses do ano passado. A partir de julho, porém, houve uma reação dos embarques e no acumulado até setembro, diz Santos, a elevação foi de 20%. Essa deverá ser a taxa ao fim do ano. Segundo ele, a desvalorização do real contribuiu ao crescimento, mas alta maior se deve mais ao aumento no volume de vendas.

"Estive há pouco no Paraguai. Neste mês vou ao Chile e à Colômbia para reuniões com clientes. Nunca deixamos de vender na região e agora vamos expandir esse contato", diz Edgard Dutra, diretor comercial da Metalplan, empresa que fabrica maquinário industrial. O mercado sul-americano, segue contando Dutra, sempre foi o mais fiel da empresa. Ele compara os clientes chilenos, com quem também busca vender mais além dos colombianos, com os clientes norte-americanos.

"Há dez anos, no nosso auge exportador, o maior mercado era os Estados Unidos. Mas eles não eram fiéis, nunca deram uma margem tão boa quanto os sul-americanos e sempre reagiam mal às oscilações do câmbio. O chileno prefere comprar o produto brasileiro, que chega a ser até 20% mais caro que o chinês, por causa da assistência, manutenção e proximidade", diz.

A retração do mercado argentino forçou o setor calçadista brasileiro a adotar uma estratégia mais agressiva de penetração nos outros mercados sul-americanos. O país governado por Cristina Kirchner foi "a grande decepção do ano" para a exportação do setor, na avaliação de Heitor Klein, presidente da Abicalçados, associação que reúne as indústrias nacionais de calçados. De janeiro a setembro, o embarque do produto aos argentinos ficou em 66 milhões de pares, volume um terço menor do que o verificado no mesmo período um ano antes. "E fora que ano passado já havia dificuldades de mandar produtos para a Argentina. Agora esse mercado vem perdendo peso entre os principais destinos de exportação", afirma Klein.

Desde maio a associação vem desenvolvendo um "plano para as Américas" focado no biênio 2015-2016. "O câmbio deu impulso a esse plano, que está com uma perspectiva mais otimista para o incremento de nossas vendas a outros latinos", afirma Klein.

Nem todas as empresas, porém, estão compensando a queda de vendas à Argentina com parceiros regionais. No setor de calçados, a Democrata sentiu nos últimos anos as barreiras dos argentinos à importação dos produtos e, mais recentemente, a redução de demanda. Marcelo Paludetto, diretor comercial da Democrata, explica que a empresa planejava ampliar a rede de lojas da marca em território argentino, mas o plano foi descartado à medida que se agravou a crise argentina. Este ano, diz ele, a queda de vendas ao país vizinho tem sido compensada por vendas a regiões mais distantes, como Rússia, Cingapura e Indonésia. Segundo ele, são destinos que têm demandado produtos com maior valor agregado e maior investimento em design e permitirão à empresa crescer o volume exportado em 10%. O diretor explica que o dólar mais alto favorece a exportação e pode permitir preços mais competitivos, mas a volatilidade traz incertezas. "Não sabemos se esse patamar próximo a R$ 2,50 é uma bolha ou se será sustentado."