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A crise na Argentina e a perda de competitividade dos produtos brasileiros deve levar a indústria brasileira ao maior déficit comercial da história. No primeiro semestre deste ano, o saldo da balança de manufaturados foi negativo em US$ 56 bilhões, maior que os US$ 54,72 bilhões de janeiro a junho de 2013. Nos últimos 12 meses até junho, o déficit atingiu US$ 106,44 bilhões, superando o recorde negativo de 2013, quando as importações de bens industrializados superaram as exportações desses itens em US$ 105 bilhões.
Os dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior mostram que as vendas externas de manufaturados somaram US$ 38,08 bilhões no primeiro semestre, uma queda de 11% ante o mesmo período do ano passado. Uma retração bem mais forte que nas importações, que somaram US$ 94,06 bilhões e recuaram apenas 3,5% no período, apesar do baixo crescimento da economia brasileira.
Parte da queda das vendas externas pode ser explicada pela exportação fictícia de duas plataformas de petróleo, no valor de US$ 2,43 bilhões, nos primeiros seis meses do 2013. Com isso, a base de comparação ficou desfavorável pois ainda não houve registro de plataformas neste ano. Ainda assim, analistas de comércio exterior afirmam que a situação é crítica e não há solução de curto prazo.
Um levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que os itens com maiores quedas nas exportações são automóveis de passageiro, partes e peças para veículos e tratores, motores e veículos de carga, reflexo direto da redução do comércio entre Brasil e Argentina. Esses produtos tiveram uma queda de US$ 1,58 bilhão em relação ao primeiro semestre do ano passado.
"O maior mercado para os nossos manufaturados é a Argentina. O problema é a grande concentração das vendas de automóveis para a Argentina", afirmou o diretor de desenvolvimento industrial da CNI, Carlos Abijaodi. As vendas brasileiras ao parceiro do Mercosul tiveram um recuo de 19,8% no primeiro semestre deste ano.
'Ano perdido'. O presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, acredita numa queda entre US$ 2 bilhões e US$ 3 bilhões nas exportações do Brasil para Argentina este ano. Segundo os cálculos da AEB, também haverá redução em torno de US$ 5 bilhões nas vendas externas de plataformas de petróleo. Em 2013, sete plataformas somaram US$ 7,7 bilhões. A AEB espera apenas duas em 2014. "Este ano em termos de manufaturados está perdido."
Castro destacou que as exportações de manufaturados estão no mesmo patamar de 2008. Lembrou também que aparelhos celulares já figuraram no topo da lista dos mais exportados e perderam destaque. "É muito caro produzir aqui. Grande parte da produção foi transferida para o México."
O presidente da AEB também não vê motivos para comemorar o aumento de 11,4% nas vendas aos EUA no primeiro semestre. "Se tirar avião e petróleo, volta à estaca zero." Lis Valls, economista do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), afirma que o déficit da balança comercial da indústria de transformação é bem maior que o registrado pelo governo.
Para Lia, o resultado da balança de manufaturados reflete a falta de competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional e a baixa produtividade do setor.
Em um cenário de queda dos preços de commodities, a balança comercial brasileira está mais dependente dos produtos básicos. Pela primeira vez desde 1980, esses itens responderam por mais da metade das vendas ao exterior. No primeiro semestre deste ano, essa categoria de produtos com menor valor agregado atingiu 50,8% do total exportado. Por outro lado, a participação das vendas externas de manufaturados caiu para 34,4%. É a menor participação na pauta exportadora para os primeiros seis meses do ano desde 1980, quando tem início a série histórica do governo.
O setor externo brasileiro tem encolhido por causa da lenta recuperação da economia mundial e do baixo ritmo de atividade econômica no Brasil. A corrente de comércio caiu 2,8% de janeiro a junho ante o mesmo período do ano passado. Para os analistas de comércio exterior, o governo brasileiro precisa apostar em acordos bilaterais de comércio, investir em infraestrutura e na redução dos custos da produção. Uma agenda antiga, mas o Brasil ainda não conseguiu fazer o dever de casa.
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