O Brasil precisará formar cerca de 570 mil profissionais por ano para atender à demanda por vagas industriais entre 2014 e 2015, o que corresponde a mais de um milhão de trabalhadores no período, segundo estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Desse total, 80% são profissionais com cursos de até 200 horas; 14% de nível técnico; e 6%, de nível superior. O levantamento revela que os cinco setores que concentram a demanda por formação para novos empregos são: construção; indústria alimentícia e de bebidas; montagem de veículos automotores, reboques e carrocerias; máquinas e equipamentos; e fabricação de produtos minerais não metálicos.
Segundo a projeção, juntos, esses setores devem responder por 53% da demanda por formação para atender a novos empregos industriais nesses dois anos. O gerente de Estudos e Prospectiva da CNI, Márcio Guerra, explica que esses trabalhadores deverão ser contratados não apenas na indústria, mas também em outros segmentos da economia, como serviços, que também exigem profissionais com formação industrial. "É o caso de um técnico têxtil que atua no controle de qualidade de aquisições de grandes magazines", diz.
Guerra observa que, hoje, as empresas precisam principalmente de profissionais de baixa qualificação, com cursos de menos de 200 horas. Entre os cargos estão os de ajudante de obras civis, motorista, aplicador de revestimento cerâmico, soldador, eletricista, pintor, auxiliar de padaria e costureiro industrial. Devido à falta de trabalhadores com essas formações, as empresas contratam técnicos ou graduados, mais um fator de pressão sobre os salários.
"É uma fuga para a frente. Por não encontrar profissionais, as empresas são forçadas a pagar melhores salários e a contratar pessoas mais qualificadas", afirma Guerra.
De acordo com o estudo da CNI, apenas no setor de construção deverão ser abertas 214,8 mil vagas em dois anos. Para a fabricação de produtos alimentícios e bebidas, o número chegará a 154,9 mil até 2015. No caso da fabricação e montagem de veículos automotores, reboques e carrocerias, a 96,5 mil no mesmo período.
Setor petrolífero lidera demanda
Daniel Rodrigues de Holanda, de 18 anos, está na corrida para aproveitar uma dessas oportunidades. O brasiliense passou quase três anos em Fortaleza e voltou para a capital há três meses em busca de melhores condições. Desempregado, concluiu o curso de eletricista predial e, agora, faz o de eletricista de manutenção industrial no Senai. Até abril, quando se forma, espera estar contratado. Mas já percebeu que o mercado não está tão fácil para quem começa. "Muitas empresas pedem experiência em carteira", conta.
O goiano Antonio Marcos Fonseca, de 34 anos, já fez de tudo um pouco. Trabalhou como soldador, cobrador, estoquista e, há dois meses, deixou o cargo de bombeiro hidráulico para tentar a sorte na carreira de técnico em automobilística. A inspiração veio de uma vizinha, que comentou sobre a oferta de cursos gratuitos na cidade. A expectativa de Holanda é começar a carreira ganhando até R$ 1,5 mil. Em três anos, estima ver o salário dobrar. "Sempre gostei da área. Nas outras profissões, não encontrei realização profissional nem consegui bons rendimentos. Decidi abraçar a oportunidade", conta.
Também disposto a mudar de profissão, o vigia Thomas Bruno Souza, de 26 anos, aproveita os dias livres para fazer o mesmo curso que Antonio e já decidiu em que área quer atuar.
"O meu plano é estudar injeção eletrônica. Com outro emprego, espero ganhar pelo menos 50% a mais", disse.
Segundo o estudo da CNI, com base no crescimento médio anual projetado no emprego na indústria para os próximos anos, setores como o de extração de petróleo e automóveis deverão crescer. Em seguida, destacam-se extração de minerais metálicos e fabricação de combustíveis. O diretor de Educação e Tecnologia da CNI e diretor geral do Senai, Rafael Lucchesi, crê que a produção industrial crescerá focada nas áreas que se manterão em expansão este ano. E as de petróleo, gás e mineração, em especial, deverão ser puxadas pelas concessões realizadas pelo governo federal e pela exploração da camada do pré-sal.
Para Lucchesi, ao demandar profissionais qualificados e gerar renda, esses setores contribuirão para o crescimento de indústrias mais leves, como as de vestuário, calçados e alimentos, e aquecer o mercado de trabalho em toda a economia. "Os investimentos em modernização demandarão mão de obra mais qualificada e o emprego técnico crescerá", diz.
Márcio Guerra disse que, embora haja carência por profissionais com qualificação baixa, o emprego para pessoas com mais anos de estudo tem crescido mais. Análise da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) 2012, realizada pela CNI, mostra que as ocupações na indústria que requerem ocupações técnicas e de nível superior foram as que, proporcionalmente, mais avançaram no país entre 2011 e 2012. As taxas na indústria foram de 3,7% e 5,3%, respectivamente. Enquanto isso, a ocupação para pessoas com qualificação de até 200 horas aumentou 0,7%.
Maior escolaridade, maior salário
Na análise de todos os setores da economia, as ocupações de níveis técnico e superior também foram as que, proporcionalmente, mais cresceram em 2012. O número de empregos formais para esses dois tipos de ocupação passou de 13.204.431 para 13.666.835, um aumento de 3,5%. Nesse mesmo período, os postos considerados de baixa qualificação aumentaram 1,9%.
Segundo o estudo da CNI, a ampliação das ocupações com maior especialização fez com que elas passassem a representar 29,2% do total de empregos formais no Brasil. Cinco anos antes, em 2007, esse índice era de 27,9%. Na avaliação da entidade, a mudança pode significar que as empresas estão elevando os requisitos para compensar a baixa qualidade na educação. "Há um esforço das fábricas para tornar os produtos mais competitivos nos mercados doméstico e internacional", disse Guerra.
No que diz respeito à remuneração, a análise mostra que a indústria oferece os melhores salários em todos os tipos de ocupação, na comparação com a média da economia. Segundo a Rais 2012, na indústria, os técnicos recebem, em média, R$ 3.170,25 por mês. Em outros setores, profissionais com o mesmo nível de formação ganham, em média, R$ 2.376,08 - menos 33,4%. Para profissionais de nível superior, a diferença chega a 64%. Enquanto o salário médio em todos os setores é de R$ 4.352,87, na indústria ele é de R$ 7.140,46.
Por Cristiane Bonfanti e Danilo Fariello/ O Globo