Um fantasma ronda o Brasil

Um estudo divulgado em junho pela consultoria ManpowerGroup, abrangendo 42 nações e regiões, apontou o Brasil como segundo país com maior intenção de contratação e o segundo também com maior dificuldade para preencher suas vagas.

Apesar da referência no título, não se trata do poltergeist comunista que prometia revolucionar as instituições europeias de 1848, como anunciado na abertura do famoso Manifesto que Marx e Engels lançavam naquele ano. Nosso fantasma é do tipo sedicioso, daqueles que se alojam e vão ficando, de modo que, logo, ninguém mais os estranha. Tornam-se da família. E é aí, nessa suposta normalidade, que reside seu perigo. Alimentadas por projetos políticos que não ultrapassam o horizonte da eleição mais próxima, as assombrações que puxam o País pelo pé são bem conhecidas, mas vou focar em uma delas: a falta de qualificação da mão de obra, que dificulta a geração de empregos de qualidade e retarda o desenvolvimento das empresas.
 
Um estudo divulgado em junho pela consultoria ManpowerGroup, abrangendo 42 nações e regiões, apontou o Brasil como segundo país com maior intenção de contratação e o segundo também com maior dificuldade para preencher suas vagas. Sob a ótica do que chama de “Era do Potencial Humano”, a empresa considera que a capacidade para formar e oferecer talentos tornou-se um novo indicador de avaliação do potencial de crescimento de uma economia. E nesse sentido precisamos avançar muito mais do que um passinho de cada vez.
 
São assustadores, por exemplo, os índices de educação que registramos. Para ficar na comparação apenas com outras nações latino-americanas, de acordo com dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), publicados em março último, apresentamos média de escolaridade entre os adultos de 7,2 anos – estagnada desde 2011 e à frente apenas do Suriname na região.
 
Perpetuar essa situação é um risco aumentado em um cenário global que, de acordo com as projeções divulgadas em junho pela Organização Mundial do Trabalho, contabilizará 208 milhões de desempregados até 2015. Por enquanto, a América Latina e o Brasil em particular figuram na posição mais confortável de menos afetados pelo deseemprego, embora, no início deste ano, a mesma OIT tenha vaticinado que a capacidade de geração de postos de trabalho na região esteja se esgotando e deva inverter a curva nos próximos dois anos. Para o Brasil de 2014, o órgão previa 6,6% de desemprego, nada menos do que 7,08 milhões de pessoas sem ocupação. Pior: sem perspectivas de competir, se nada for feito para resolver o nó da falta de qualificação profissional.
 
O mercado de trabalho brasileiro (e mundial) vive um paradoxo. De um lado, estão empresas sem mão de obra adequada para preencher seus quadros e, de outro, massas de profissionais desprovidos das competências necessárias para conseguir esses empregos. Governos e instituições de ensino mostram-se incapazes de construir a ponte entre uns e outros. E todos sabem que o custo econômico e social da disparidade é alto.
 
Tanto se sabe disso que, no seu Mapa Estratégico da Indústria 2013-2022, a Confederação Nacional da Indústria aponta a melhoria da educação como base para o crescimento industrial nos próximos dez anos. A falta de engenheiros e de tecnólogos é o gargalo do setor, que reclama ainda da baixa qualidade da educação básica, da falta de cursos técnicos e de falhas no Ensino Superior. Contadores e profissionais de finanças ocupam o posto de sexta categoria mais demandada.
 
É um problema para empresas, governo, universidades e indivíduos – vítimas finais de um círculo vicioso que precisa ser quebrado, se quisermos exorcizar os fantasmas que mantêm nosso potencial de crescimento atado às correntes da baixa produtividade e da incapacidade de gerar empregos de qualidade. O desenvolvimento do País depende disso.
 
 
*A autora é mestra em contabilidade, professora universitária, sócia da TG&C - Trevisan Gestão & Consultoria e da Efycaz Trevisan – Aprendizagem em Educação Continuada.
 

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