O aumento da importação da indústria de transformação neste ano está concentrado em setores de média-alta e alta tecnologia, e não naqueles de baixa e média-baixa tecnologia, como ocorreu no primeiro semestre de 2012. Essa mudança provocou expansão de 13% no déficit no conjunto de produtos de maior valor agregado, que ficou em US$ 46 bilhões no acumulado de janeiro a junho.
Busca por competitividade pelas empresas, necessidade de atualização tecnológica e consumo de maior valor agregado menos afetado pela inflação e desaceleração da atividade são fatores que influenciaram o resultado na visão de analistas.
Os números estão em levantamento do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), com base em informações do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. A comparação se dá sempre entre o acumulado do primeiro semestre do ano com o mesmo período do ano anterior.
De janeiro a junho do ano passado, os setores de baixa e média-baixa tecnologia puxaram o incremento das importações, aumentando o valor de compras em 8% e 12%, respectivamente. Também em 2012, setores de média-alta e alta tecnologia, juntos, importaram 3,5% a mais e deixaram saldo negativo de US$ 41 bilhões. Neste ano, com o crescimento de 7,2% das compras dos dois setores, esse déficit ficou US$ 5,5 bilhões mais elevado.
Neste ano, as indústrias farmacêutica e química foram responsáveis pelo aumento de 5,1% nas importações do grupo de alta tecnologia. Nos setores de média-alta tecnologia, máquinas e equipamentos mecânicos e elétricos, veículos e químicos registraram importação 9,2% maior.
Segundo o economista Julio Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e professor da Unicamp, o apetite maior da ponta da indústria neste ano vem acompanhado de um freio na importação de setores com menor intensidade tecnológica, como papel e celulose, alimentos e bebidas e produtos metálicos, que integram os produtos de baixa e média-baixa tecnologia. O primeiro registrou queda de 0,5% nas compras externas, enquanto o segundo teve aumento pouco expressivo, de 0,9%.
"O levantamento mostra que esse movimento ocorre junto com o recuo das exportações de produtos com maior tecnologia. Isso mostra que, primeiro, a indústria nacional está importando para produzir e competir no mercado interno e, segundo, que está perdendo espaço no exterior", diz.
De fato, as exportações mostram resultados inversos aos da importação. Alta tecnologia teve queda de 11,8% e média-alta recuou 4,6%. Ano passado, esses setores exportaram 10,2% e 0,3% a mais, respectivamente.
A atividade econômica e o consumo do país neste primeiro semestre explicam os dados do comércio exterior da indústria, na avaliação de José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). No primeiro trimestre do ano, o consumo das famílias cresceu apenas 0,1% no Produto Interno Bruto (PIB) de acordo com o IBGE, enquanto a pesquisa de confiança das famílias mostra queda de 5,8% de janeiro a junho.
"Setores com mais tecnologia têm a receita menos afetada com a crise. O consumo se mantém mesmo que o preço suba um pouco, pois quem compra esses produtos possui mais renda disponível. Além disso, a indústria está importando para aumentar o leque de opções de venda, apostando mais na alta renda, menos sensível à desaceleração", afirma Castro.
Lia Valls, economista da Fundação Getulio Vargas (FGV) especializada em comércio exterior, credita ao arrefecimento da importação na base da indústria a desaceleração da economia, e o aumento, na ponta dela, ao crescimento do investimento e ao esforço de modernização de setores, como o farmacêutico. "Sempre tivemos a tendência no país de importação de produtos de alta e média-alta tecnologia", diz.
Houve incremento das compras externas mesmo em setores beneficiados com medidas governamentais, como reservas para compras governamentais e conteúdos mínimos de produção local. Farmacêutico e instrumentos médicos e óticos, que importaram US$ 807 milhões a mais neste ano, estão no plano Brasil Maior, por exemplo.
"São setores que esbarram na falta de oferta interna. O lado positivo dessa importação de alta tecnologia pode ser o impacto na modernização na produção. O desafio do Brasil é sempre foi a inovação. Esses déficits são estruturais", afirma Lia.
Por Rodrigo Pedroso/ Valor Econômico