Tradings estocam cobre e ameaçam oferta

Alguns fabricantes e construtoras receiam que o cobre venha a faltar se a demanda subir de repente ou se a produção das minas tiver algum problema.

Duas grandes empresas de negociação de commodities acumularam uma grande parcela dos suprimentos mundiais de cobre em seus armazéns, em parte pagando para desviar remessas destinadas a outros centros de estocagem, dizem operadores e analistas do setor.

Essa concentração de estoques de cobre despertou a preocupação dos consumidores industriais do metal. Alguns fabricantes e construtoras receiam que o cobre - que é usado em produtos como automóveis, placas de circuitos impressos e encanamentos - venha a faltar se a demanda subir de repente ou se a produção das minas tiver algum problema.
 
A Bolsa de Metais de Londres (LME, na sigla em inglês), principal centro mundial de compra e venda de metais industriais, certifica uma rede mundial de depósitos de onde os metais podem ser despachados para atender aos contratos futuros da bolsa. O tempo de espera para receber alumínio e zinco nos armazéns de certos locais vem aumentando nos últimos anos, enquanto as pilhas de metais se acumulam.
 
Agora há temores no mercado de que a tendência esteja passando para o mercado de cobre. "A situação atual, em que os proprietários dos armazéns da LME estão pagando grandes incentivos para atrair o cobre e depois sujeitam esses locais a longas filas para descarregar o metal, está efetivamente tornando o cobre indisponível para entrega imediata para servir os consumidores industriais", disse um porta-voz da Southwire Co., a maior fabricante de fio de cobre dos Estados Unidos, num comunicado enviado por e-mail.
 
Os preços do cobre vêm caindo desde fevereiro diante da expectativa de um excesso de oferta, mas os compradores do metal dizem que estão começando a pagar pesadas taxas para obter a commodity quando precisam dele - além do preço do próprio cobre - porque grandes quantidades estão sendo desviadas para os armazéns.
 
As taxas de armazenagem têm anulado parte dos benefícios da queda do preço do cobre para as indústrias consumidoras. A quantidade de cobre nos armazéns da LME aumentou 84% desde o início do ano, para 590.175 toneladas, a maior em dez anos. O aumento, de mais de 270 mil toneladas, é quase o dobro da estimativa de superávit de 153 mil toneladas de cobre para este ano, segundo especialistas - prova do sucesso dos armazéns em atrair o metal do mercado aberto para os seus galpões.
 
Boa parte dos excedentes está se acumulando em armazéns que pertencem à Glencore International e à Trafigura Beheer, segundo operadores de Londres, Nova York e Cingapura, que negociam com essas empresas ou com seus clientes.
 
A Glencore não quis comentar o assunto. Um porta-voz da Trafigura também não quis comentar o papel da empresa no sistema de armazenagem, mas disse que o aumento dos estoques de cobre neste ano se deve principalmente à desaceleração da demanda da China e ao aumento da produção das minas.
 
A negociação física de matérias-primas é, de modo geral, não regulamentada e não há nada de ilegal em estocar metais. Os preços de referência do cobre na LME fecharam estáveis na sexta-feira, a US$ 7.545,50 a tonelada.
 
Operadores e analistas dizem que notaram a mudança quando o cobre começou a se acumular em lugares incomuns. O aumento está chegando a portos que não costumam receber o metal. Este ano, 60% do aumento nos estoques ocorreram em Antuérpia, na Bélgica, e em Johor, na Malásia, de acordo com dados da LME. Os armazéns desses lugares, muitos dos quais pertencem e são operados pelas duas tradings, tinham pouco cobre estocado até este ano.
 
A Trafigura é a maior proprietária de armazéns em Antuérpia, enquanto a Glencore possui o maior número em Johor e em Nova Orleans, onde também vem ocorrendo um grande aumento nos estoques de cobre, segundo dados da LME. Ela ão divulga a quantidade de metal mantida em cada armazém, mas os operadores e analistas dizem que o acúmulo está ocorrendo em instalações da Trafigura e da Glencore.
 
As empresas nem sempre compram todo o cobre, mas cobram pelo armazenamento e pelo transporte. Devido à logística, o tempo de espera pelo cobre de Antuérpia pode chegar a 25 semanas e pelo de Nova Orleans, a 18 semanas, segundo levantamento realizado pelo The Wall Street Journal com dados da LME. A espera pelo cobre de Johor é de seis semanas.
 
A tarifa para entrega de cobre nos EUA está em US$ 132 a tonelada, a mais alta em seis meses, segundo o serviço Platts de informações de preços. As taxas na Europa são as mais altas em quatro meses, de US$ 85 a tonelada. A tarifa é paga por quem quer cobre para entrega imediata no mercado à vista.
 
A Pacorini Metals Group, unidade de armazenagem da Glencore, está há meses tentando atrair ainda mais cobre para suas instalações em Johor, de acordo com operadores. No início do ano, a Pacorini começou a oferecer aos fornecedores, incluindo mineradoras da América do Sul, até US$ 120 por tonelada acima do preço de referência do cobre na LME para o envio de remessas diretamente a seus armazéns em Johor, dizem operadores de Londres. O preço oferecido é, no mínimo, US$ 20 a mais por tonelada do que os distribuidores do metal na China pagaram recentemente e mais de US$ 100 acima da taxa vigente no restante da Ásia.
 
Um armazém oferecer pagamentos em dinheiro pelos metais não é tão raro, dizem operadores e analistas, mas cobrir os preços de concorrentes com uma margem tão grande é. "Isso já está afetando o mercado", disse Liu Jiang, gerente de compras de uma fábrica de cabos de cobre, acrescentando que o prêmio pago pelo cobre no mercado à vista em Xangai subiu cerca de 40% nas últimas duas semanas. "A concentração nesses três armazéns está reduzindo a oferta de cobre disponível, e, como estamos na época de pico da produção de cabos de cobre na China, sem dúvida seremos afetados."
 
Por Matt Day/ The Wall Street Journal